sexta-feira, 28 de janeiro de 2011


Oooopa!

                Tudo bem por aí? Por aqui tudo certo! Finalmente está marcada a cirurgia pra tirar a borseta! Nem acredito. Eu nem estava ansioso por isso, quase nada!
                Foi o seguinte: Hoje teve um monte de coisas no hospital, e entre elas a consulta com o Rodrigo. Eu fui na expectativa de tirar o tubo. E parecia que ia tirar mesmo, já que, ao me pesar, vi que engordei dois quilos nessa última semana. No total, quatro quilos em duas semanas. Maravilha pra quem estava emagrecendo e tal, né! E eu anotei, conforme o Rodrigo havia pedido, tudo o que eu comi essa semana. No início da consulta ele disse que não tiraria o tubo, pois achava que eu não havia comido o bastante. Mas é difícil dizer isso, pois lá constava o que eu havia comido, mas não a quantidade. Não tenho balança em casa. E, de verdade, eu comi bem essa semana. Por exemplo, na maioria das noites eu jantei sopa. Mas não era sopinha light de regime. Não, era sopa barbárie da minha mãe. Sopa de feijão com macarrão, creme de aspargo... Tudo bem reforçado, já que minha mãe está levando a sério esse lance de eu engordar! Só esquece que ela também emagreceu e precisa comer melhor. Mas isso é outra história, não menos importante, mas é complicado. É aquele lance, ela só se preocupa comigo e esquece dela. O Rodrigo até deu risada quando eu falei que tinha que colocar o tubo na no nariz dela. Ela não gostou muito da brincadeira, assim como vai reclamar, com certeza, de eu ter escrito isso aqui! Desculpa minha véia, você é cabeça dura, não vai admitir, mas sabe que é verdade.
                Mas então, aí o Rodrigo perguntou pra minha mãe se eu estava comendo bem e ela disse que sim. Meio receosa em dizer isso, mas disse. Ele então deu a sugestão. Falou que, se eu quisesse, ele tiraria o tubo na hora, ali mesmo. Mas que me aconselhava a mantê-lo. Isso porque eu ganharia mais peso e chegaria tranqüilo para a cirurgia da borseta. Parece que é meio chatinha essa cirurgia. Depois que termina, eu tenho que ficar uns 3 dias sem comer, porque tem que cicatrizar e tal. E é uma cicatrização complicada. Isso porque ele fez meio que uma bifurcação no meu intestino. Uma saída é na minha barriga, na borseta, e a outra é no brioco! Heheh E a saída na minha barriga é uma bola até que grande, tem uns 2 cm de diâmetro. Aliás, hoje eu fui trocar a borseta e fiquei viajando. É estranho, parece um pedaço de um nariz do lado do meu umbigo! Lembro que eu divertia as enfermeiras quando elas iam trocar a borseta pra mim, logo após o transplante. Eu ficava pondo o dedo e falando “olha, eu posso encostar o dedo no meu intestino, você pode encostar no seu?” Elas rachavam o bico. Deviam pensar “que gringo retardado é esse?”   
Bom, mas aí, por ser um buraco grande na barriga e um corte também no intestino, já que a parte que sai na minha barriga é cortada fora, tem que deixar o lance quietinho pra cicatrizar. E eu acabo emagrecendo uns 2, 3 quilos. Ele falou também que, no caso de ter algum resto de tumor ou qualquer coisa estranha por ali, ele também vai tirar. Então, é bom eu ter uma margem pra poder emagrecer, sem risco de ficar fraco demais e dar aquela rejeição ao contrário de novo. Outra vantagem de manter o tubinho camarada, é que eu poderia tomar nutrição nesses dias de recuperação em que não pudesse me alimentar, evitando perder tanto peso. E, se tirasse o tubo hoje, poderia perder muito peso e ter que cancelar a cirurgia.
Só um parênteses: não agüento mais falar/escrever “tubo”. Mas não tem outra palavra, é um tubo... ah, posso chamar de espagheti.... não, acho que não... é meio nojento imaginar um espagheti preso na garganta o tempo inteiro há duas semanas, né! Vou continuar escrevendo tubo, mesmo. Mas então, falando assim, fica óbvio que eu não deveria, de jeito nenhum, tirar essa porra desse tubo. Ele viu que eu fiquei bem indeciso e ficou um tempão me falando sobre isso, dando até sermão, na linha “pra quem já se ferrou tanto, como você, isso (mais tempo com o tubo) não é nada”. O que, felizmente, ou infelizmente, é verdade. Me deixou assustado um pouco ao falar sobre a gravidade do que pode acontecer em caso de dar uma merda. Explicou que é um problema irreversível, que não tem o que ele possa fazer. Eu ficaria na UTI até dizer chega. Porque aqui eles não deixam morrer. Eles te mantém na UTI o tempo que for, sofrendo o que for também. Coisas da lei, burocracia, sei lá, nem quis entender, na verdade. Na hora até eu lembrei daquele filme “Mar Adentro”! Aí ele fechou o filme de terror dizendo que o que eu sofri até hoje não é nada perto do que poderia acontecer em caso de uma zica pós-transplante. Confesso que, dessa parte, eu desconfiei um pouco, já que eu quase morri. Literalmente, e mais de uma vez, né. Mas prefiro não saber como é um sofrimento que, perto dele, o que eu passei não é nem cinco por cento! E outra, claro que o objetivo do Rodrigo não era comparar sofrimentos, e sim me mostrar que não dá pra vacilar com a recuperação de um transplante.
Eu entendi o recado. Não sou burro, nem masoquista. Não concordei logo de cara porque estava realmente muito empolgado com a chegada do dia em que tiraria o tubo. Eu esperei a semana inteira por hoje, e acordei até feliz me imaginando sem o tubo. Tem muitas coisas boas no fato de não ter um tererê exótico no nariz. Olha, vocês não têm e não sabem como é bom não ter, viu. Só alguns exemplos, rapidinho: aquela assoada no nariz... Esquece, você pode assoar o tubo! No banho, não rola aquela água na cara enquanto você fica enchendo a boca e cuspindo a água alguns minutos, praticamente em transe! A hora de engolir, eu já falei, não é legal. Outra pentelhisse desse tubo. Pra prender, eu coloco uma fita adesiva no nariz e outra na bochecha. Mas sempre solta, normalmente a noite, quando me mexo mais. E aí fica aquela gosma de cola, que sabonete não tira. Você fica igual um animal na frente do espelho esfregando, aí seca com a toalha, crente que tirou tudo, põe a mão e seu dedo gruda! Eu sempre desencano de tirar a cola e só colo a outra fita em cima e foda-se. Mas ela não gruda direito e logo cai. Aí você vai trocar e tem ainda mais gosma! E assim vai, ficando cada vez mais divertida a brincadeira! Mas hoje eu peguei no hospital um lance que é um removedor de cola. Usei e já estou há umas nove horas sem trocar o adesivo. Recorde, disparado! É isso ae timê! Heheh
Outra coisa que me incomoda é as pessoas olhando com cara de bunda, como falei no outro dia. Alguém pode falar “desencana, não se importe com os outros!” Eu sei disso, mas ah, vai! É um discurso muito bonito, ideal, mas é aquela coisa, pimenta nos olhos dos outros é refresco, né malandrão! Pra cima de mim, não! heheh
Mas hoje posso dizer que eu já evoluí bem nesse ponto, até. Forçado, é verdade, já que, nesse tempo, tive todos os tipos de atrativos. Teve cateter pendurado na teta. Teve a vez que fui pra praia pesando 55kg (tenho 1,86m). Tive, e ainda tenho, uma bolsa na barriga... que as vezes enche rápido e fica um lance lá... fico parecendo o Kid Bengala com caxumba! Heheh. Outra vez fiquei carecão por causa da quimio... Se bem que, nessa fase, a Jack falava que eu estava lindo “carequinha”. Mas eu não sou bobo e estava careca de saber (heheh) que a Jack só dizia isso porque o amor é cego! Mas, sério, se estavam olhando muito, eu não olhava de volta e pronto. Era o melhor jeito. Não me encolhia, mas, também, não ia pro “tá olhando o que?”. Ficava na minha, já que o fato é que eu não veria nenhuma daquelas pessoas novamente, então porque encanar com o julgamento delas. Não era sempre que eu conseguia, mas estava ficando bom nisso. O tubo está sendo uma boa escola, já que, até no hospital, onde tem um monte de gente em tratamento pelos corredores, as pessoas olham com cara de nádegas.
Mas enfim, como não sou um monge tibetano desapegado das coisas mundanas, eu não me sinto a vontade pra sair por aí com essa parada. Aí fico em casa. Mais um motivo pelo qual queria tirar o tubo. Ah, mas pelo menos consegui ressucitar meu notebook! Nada a ver com o assunto, eu sei, mas é que eu fiquei maior feliz! É, porque anteontem deu uma zica aqui, peguei um vírus barbárie. Sorte que um casal de amigos aqui de Indianapolis nos ajudou! Na verdade, nos salvou! É, porque a gente não conhece nada, aí o Renato, um xará gente fina, passou o contato de um cara que veio aqui e em uma horinha arrumou tudo. E não perdi nenhum arquivo. Foda é que cobrou 80 doleta! Mas é o preço. Aqui todo serviço é muito valorizado e bem pago. Sem querer dar uma de paga pau de americano, estou longe disso, mas eles respeitam mais o trabalho aqui. Ou, sei lá, se organizam melhor e combinam que ninguém vai cobrar abaixo de um valor “x”. Assim, quem quer o serviço paga isso, senão se vira! E isso vale pra qualquer serviço, de qualquer nível. Certo, eles!
Bom, mas voltando, deu pra perceber que eu decidi não tirar o tubo, né. Mas a parte boa da história (sempre tem, viu?) é que, dessa forma, é certeza que, na próxima quarta-feira, dia 2 de fevereiro, eu vou fazer a tão esperada cirurgia de retirada da borseta. É a última etapa do tratamento! Eu fico dois ou três dias internado e pronto. O tubo eu tiro no dia que me derem alta. Aí,  é só esperar, ver se eu volto a comer direito, se não dá nada, e boa. Alta pra voltar pro Brasil! Nem acredito! Dá até vontade de chorar quando me imagino voltando pra casa! Eu não gosto de criar expectativa, mas acho que pelo menos antes do meu aniversário eu volto! Na verdade, acho que volto bem antes que isso, mas prefiro ser mais humilde! heheh
                Ah, e só pra terminar bem hoje, os exames de sangue deram tudo bem. Mas um especificamente me animou mais. É um que mede a imunidade, a resistência. Ele dá um número e classifica. O meu deu mais de mil e “strong”! Esse é o melhor nível que pode chegar! É justamente o que estava ruim quando deu aquela zica. Agora esses órgãos vão ficar pianinho, não vão abrir a boca pra me encher o saco! heheh

                Olha, consegui assoar o nariz! E deu certo, o tubo continua no lugar! Viu, se alguém, algum dia, precisar assoar o nariz mas estiver com um tubo nele, é só me perguntar que eu ensino! heheh

                Ah, e Kamila, minha prima, um recado da Santinha: “Obrigado e parabéns pelos 20, Ka!”

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Faaaaala!           
              Meu, hoje não tenho nada, mas nada mesmo, pra contar! heheh Sério! Não foi um dia muito interessante. Ah, pra não falar que não teve nada legal, eu comi pra caramba. Foi o dia em que eu mais comi. Acho que até exagerei! Mas não é pra eu comer bastante e engordar? É o que eu estou fazendo. Até porque não tem mais nada pra fazer! E como não fico muito a vontade pra sair com esse tererê pendurado no nariz, o dia fica bem monótono. Eu fico no computador, fuçando na internet. Vejo muita coisa no Youtube... A televisão aqui não anima muito, não. E aí vai indo o dia. Aí, pra não ficar nesse papo chato de paciência, que falta pouco e isso e aquilo (podem ficar tranqüilos, eu sei disso!), eu vou por umas fotos. São fotos que a gente foi tirando mas eu, preguiçoso, não tinha passado pro computador ainda. Ou tinha, mas a preguiça deixou eu ir só até o computador, não consegui chegar ao blog!
            Então, aí vão as fotos. Beijo pra todo mundo!

Boa essa foto, né! É capaz de até minha mãe gostar! Olha a cara de felizão do meu pai com a Santinha no colo! Acho que era noite de reveillon.


Os passageiros mais ilustres! E ah se o zíper desse casaco falasse! heheh

No Hooters jantando. Essa cara do Dudu não é pra mim, não tenho nada a ver com isso! É culpa da cerveja gelada e com bastante gás que ele estava tomando naquele copo... olha só o colarinho cremoso!
Saindo do Wal-Mart! Nossa, esse dia meu pai ficou desesperado no carro "Tá um troço de doido essa neve, olha só isso Silvia! Vixi Maria! Cuidado, devagar!"


Eu e minha véia na entrada de um shopping, na parte rica da cidade! É longe, viu! Descobrimos esses lados indo atrás dos seus patins, Ligia! Aliás, o que eu ouvi de "o que você acha desse, Rê? E desse?". 


Mais uma do casal mais bonito que já passou por Indianapolis! Na verdade, que já passou pelos EUA! Ainda mais o Seu Luiz, com seu inseparável gorrinho! E a camisa de 7,99!

Essa é pra dar um susto na galera! heheh Mas não reclama, não, que eu tinha acabado de fazer a barba, olha só que boniteza! E o cavanhas é rumo ao joelho!

A gente no jogo do Pacers! Detalhe para o jóinha da minha mãe! heheh

Outra do jogo do Pacers. Tá embassada, mas eu gostei dessa foto.



É nóis na sala!

Eles lendo o blog. O engraçado é que Dú faz essa cara e depois fala "Legal, Rê, gostei sim!", e quer que eu acredite, né!


Um dia em que, não sei de onde, tiramos coragem de dar uma volta nesse frio, e fomos até o Canal. Queríamos mostrar pros dois, nossas visitas! A gente ia muito nesse canal antes da cirurgia, quando estava quente.Ficava cheio, um monte de gente correndo, andando de bike. Dessa vez só tinha a gente e mais um ou outro louco, que com certeza deviam ser turistas também! E olha o charme da minha mãe!

No mesmo dia. Deu medo de descer essas escadas!


E olha como tá congelado o Canal! A gente jogava pedra com força e só quicava!


Indianapolis Motor Speedway. É dentro do autódromo onde rola as 500 Milhas de Indianápolis. Mas dentro mesmo, a pista é em volta. Bem legal esse museu. Tem um filme também que você assiste, de uns 20 minutos, que conta a história de autódromo. Foi o primeiro a ser construído, e era de pedra, só depois virou asfalto e tal. A idéia era ter uma pista pra testar os carros das fábricas, que eram, a maioria, aqui na região. E esse ano está completando 100 anos. E meu pai, como sempre, bem agasalhado!



 Esse é o primeiro carro que você vê, logo na entrada do museu.




Meu pai pensando: "como que o cara dirige esse troço, não dá pra enxergar nada!" Esse era o único carro no  qual você podia entrar.


Uma maquete de Lego! E aí dá pra ver onde é o Museu em relação à pista.


Nem fiquei com vontade de dirigir esse carro! Prefiro meu Fox 1.0... bem mais legal!

Esse também não!

Esse sim! heheh

Tinha várias motos também. Essa é uma Harley-Davidson! Doido, né!


segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Oooopa!

                Então, hoje não tem novidade. Agora só na 5ª. feira, quando voltar lá pra conversar com o Rodrigo, tirar o tubo e ver se marco a cirurgia da borseta. Mas estou bem animado com os próximos passos. Eu estou comendo quase normalmente. Acho que quando tirar o tubo da garganta, aí já era. Mas isso eu só vou saber quando tirar mesmo. De qualquer forma, estou bem otimista, e muito ansioso. Me sinto muito bem. Não vejo nada que possa atrapalhar.
                A ansiedade é que está incontrolável, agora! Nossa! Sabe quando você está com muita vontade de fazer xixi, bem apertado mesmo. Aí você segura, agüenta e tal, por três horas, naquele puta trânsito. Mas quando chega em casa e pega o elevador, aí o bicho pega, você quase faz nas calças! Pois é, eu e minha mãe estamos no elevador! É impossível pensar que tudo bem, já estamos quase no final, o pior já passou e tal. Não tem como! É, porque antes não tínhamos perspectiva nenhuma de voltar! Então não havia expectativa também! Agora não. Agora eu sei que a hora de voltar está próxima! Então eu só penso nisso! Quero muito ter já uma data pra voltar, poder pensar no dia e começar a contagem regressiva!
Ah, e na quinta-feira passada meu pai foi embora! Fomos levá-lo aeroporto e ficamos lá até ele embarcar. Como eu queria estar indo no lugar dele! Eita, fiquei só imaginando eu lá, esperando a hora do nosso vôo... Imagina só! Mas vocês não tem idéia (ou tem, né) como minha mãe ficou toda chorosa! Mas é sempre assim. Quando a Stella foi, ela chorou “ai como a gente vai ficar sem a Nhéinha aqui?”. Depois foi o Dudu. “Aaaah Rê, eu não queria que o Dú fosse embora!”. Agora meu pai. “Aaaaaah e agora Rê?”. Aí faz o biquinho, o nariz fica vermelho e já era! Mas é estranho mesmo, de repente a casa fica muito quieta. O Dú ficou quase um mês, meu pai ficou um mês e meio. E eles agitavam bastante. As vezes eu até ficava cansado, mas na verdade era bom, distraía, fazia o tempo passar mais rápido. Agora vamos ter que acostumar com a calmaria, de novo. Vamos terminar nossa aventura como começamos: só nós dois!
E é um saco esse negócio de ficar se despedindo, falando tchau. Quando saímos do Brasil já foi muito ruim. Uma sensação horrível, na verdade. Não sabíamos o que nos esperava. E nem por quanto tempo estaríamos longe. Mesmo assim, eu vim com a melhor das expectativas em relação ao tempo. Se me perguntassem, eu falava sempre em uns três meses. No fundo, acho que eu não acreditava muito nisso. Mas que eu tentava, ah tentava! Só que na primeira consulta o Rodrigo já falou “nem pense nisso, pense só na sua saúde, você veio aqui se curar, e o tempo que precisar pra isso, vai ser”. E foi com essa racionalidade que eu procurei encarar isso tudo. Mas não é saudade, só, o problema. Claro que essa é a pior parte de tudo, ficar longe da namorada e tal. Acho até que já falei disso. Com certeza é a maior fonte de cabelos brancos, essa saudade. Mas não é só isso. Eu sinto como se o mundo todo estivesse rodando, todo mundo tocando a vida, e eu não. É como se eu tivesse saído do mundo. Pior, na verdade. Eu deixei de existir, de certa forma. Mas calma, sem o drama dessa frase. Digo num sentido prático, mesmo. Não dá pra fingir que estou vivendo minha vida. Eu posso até estar aprendendo, na verdade estou aprendendo muita coisa nesse tempo. Mas tocando minha vida eu não estou. Estou consertando ela, pra poder voltar a vivê-la. E, numa boa, cansei de aprender, quero voltar a viver, logo.
Aí alguém pode dizer mil coisas legais. Tipo, que eu tenho a vida inteira pela frente. Ou que eu estava muito mal, agora estou muito bem... Ah um monte de coisas, que eu concordo. Mas isso a gente pensa depois. Quando eu voltar, vai ter feito no mínimo cinco meses que eu saí. E três anos que eu saí da roda. No mínimo da forma como todo mundo costuma a rodar, né. E, pensando agora, estou bem animado pra voltar. Mas, sei lá, acho que só quando firmar meus pés no chão mesmo é que vou sentir as diferenças em mim e no mundo. Porque eu não parei só de trabalhar. Isso, talvez, é o que faz mais diferença na rotina. O nosso dia a dia é definido por estudos e trabalhos, né. Isso é a maior referência, o que guia os horários, hábitos... muito do que se pode ou não fazer. Enfim, isso é um fato né, não precisa ser nem nerd, nem workholic. Todo mundo vive nessa estrutura. Ou quase todo mundo, vai... só pra não generalizar.  
Então, quando você não está trampando, nem nada, você fica meio avoado, meio solto no ar, é estranho. E eu ainda fiz alguns cursos, dei uma agitada quando meu ânimo permitia. Mas não é a mesma coisa. É aquele lance, o que você mais quer quando está na correria é ficar em casa, sem obrigação. E no meu caso, eu ainda continuei recebendo salário... perfeito, né, sem fazer nada e ganhando dinheiro! Mas meu, você pode odiar seu emprego (o que, penso eu, é mais comum que o contrário), mas experimenta ficar bundando em casa um período maior do que umas férias. Sério! Só não vale bater a cabeça contra a parede, com força, repetidas vezes! Heheh Não, eu não fiz isso... continuo são... eu acho! Mas, de verdade, é muito ruim, você fica bem perdido, perde um eixo que sempre organizou sua vida. Só essa mudança já é muita coisa pra cabeça.
O lance é que não foi só isso. Eu acabei saindo também da minha vida social. Foi gradativo, ficando cada vez pior. E chegou ao extremo de eu não sair de casa quase nunca nesse último ano. Quem quisesse me ver, tinha que ir em casa. A Jack, eu devo ter buscado na casa dela umas cinco vezes, no máximo, esse ano. Pra me ver, ela tinha que ir em casa. E ficar lá comigo. E pra ver ela, eu tinha que pedir pra ela ir em casa. Isso sem falar das temporadas internado. Com certeza isso não faz bem pra um namoro, viu! E com meus amigos também. Eu praticamente deixei de encontrar o pessoal. No primeiro ano até que consegui manter, só me incomodava com o fato de não poder beber com eles (estava reclamando de barriga cheia, né! rs). Mas depois, eu não me sentia confortável em sair com aquelas coisas todas, borseta, cateter e toda a situação. É, porque eu queria sair e curtir. Não queria estar mal e deixar todos preocupados comigo, se eu estava bem ou não. Mas não por querer dar uma de super-homem, não. Apenas porque eu queria ter aquele momento como todo mundo, ser mais um na roda de conversa, sei lá.
É difícil descrever essa sensação. Não gostava que ninguém percebesse meu esforço em estar ali. Por pior que eu estivesse, eu queria que pensassem que eu estava super bem. E como eu não sabia que teria o transplante, achava que viveria assim sempre. Então rolava um conflito, eu tinha que me acostumar com a situação. Não podia sofrer toda vez! Eu pensava que tinha que absorver essas dificuldades e seguir. E era isso mesmo que eu devia fazer, tinha que chegar ao ponto de achar tudo aquilo normal. Por isso eu me forçava a sair... a querer sair. Em casa eu ficava mais tranqüilo, era melhor receber as pessoas lá. Era mais fácil, mais seguro pra mim, por vários motivos. Mas ao mesmo tempo era ruim. Me incomodava ser visitado. Aquele lance de doente que não pode sair e os amigos vão visitar! E sempre achei que o esforço tinha que ser meu. Eu que tinha que ir atrás da vida e descobrir como viver desse jeito. Até porque não tinha pra quem perguntar nada, ninguém saberia me dar conselhos de como viver sem intestino! Por isso mesmo eu não podia esperar que ninguém soubesse lidar com essa minha nova condição e se adaptasse a mim. Eu que tinha os problemas, aquela realidade era minha, e eu que tinha que me virar e deixar as pessoas confortáveis com isso. Não podia passar essa responsabilidade pros outros, esperando que se virassem pra eu ficar bem, né. Senão seria sempre o amigo doente! Eu queria que todos fossem como sempre foram. Queria ser o Renato de sempre pra todo mundo. Claro, com as mudanças que vieram juntas, mas as mudanças na pessoa, na cabeça. Não queria ser diferente pelas restrições. Por isso não queria que tivessem que se pensar nessas coisas. Era o único jeito pra poder manter todas essas relações, que eram tão importantes pra mim.  
É confuso isso. Mas assim, mudanças seriam, e serão, inevitáveis em mim e na forma como me relaciono com o mundo. Eu não sou mais o mesmo de três anos atrás. Mas eu quero levar pra fora a parte boa disso tudo. Talvez isso seja orgulho. Pode ser, mesmo, sei lá. E se for, acho que é legítimo. Mas antes desse transplante, isso era praticamente impossível. Na maioria das vezes, estava sempre escrito na minha testa “estou mal”. Por exemplo, se eu ia em algum churras, ou coisa do tipo. Eu não queria que percebessem que eu estava morrendo de vontade de comer! Não tinha porque! Aquilo era um problema meu, eu que tinha que saber lidar com aquilo. E não sei nem se todo mundo sabia, poe exemplo, que eu não podia comer. Se me perguntavam se eu queria, eu falava que já tinha comido. O que não era mentira, né... eu já tinha tomado a nutrição mesmo! Era mais fácil assim, eu acho que era uma informação muito pesada. Imagina se me oferecem um lance pra comer e eu respondo “ah, que vontade, mas eu não posso comer porque não tenho intestino!” Meu, acabo com o dia da pessoa, na hora! Deixaria ela até se sentindo culpada por ter me oferecido! Pra quê? E eu sabia que teria comida, se eu não fosse dar conta de estar lá, eu que ficasse em casa e não enchesse o saco, ué! Mas o que eu queria é curtir, mostrar pra mim mesmo que era possível curtir, e que os meus problemas não eram maiores do que eu. Por mais que, muitas vezes eles, me quebrassem as pernas. Eu fazia isso pensando em o que faria o momento mais legal pra mim, mesmo. E se fosse legal pra mim, seria pra quem estava comig! Ah, eu queria uma energia tranqüila, sem aquele clima de preocupação, ou qualquer diferença em relação às outras pessoas. Queria só curtir um sábado de sol (aliás, "sábado de sol" sempre lembra aquela música do Mamonas Assassinas, né! heheh). E se eu não desse motivos pra se preocuparem comigo, então pronto, eu poderia estar mais relaxado, tentar ter um momento mais tranquilo, natural, por mais que minha situação estivesse longe de ser tranquila.
 Enfim, era complicado manter o pouco de vida social que eu tentava ter. Não era só sair e pronto. É aquilo que eu falei num outro post, tinha muita coisa entre eu e as pessoas. E isso me atrapalhou muito, me isolou, mesmo quando eu estava junto de todo mundo. E por mais que eu tentasse achar uma forma de conciliar tudo aquilo, era difícil. Era um esforço muito grande. Eu virei uma pessoa muito complicada. E tinha a parte prática também. Por exemplo, uma coisa que era chata quando eu saía era o banheiro. Eu precisava ter acesso sempre, a borseta enchia umas vinte vezes por dia, e tinha vontade própria. Então eu estava sempre usando o banheiro e às vezes tinha que ser rápido.
Rolaram algumas situações estranhas até, por causa de banheiro. Lembro uma vez que fui com a Jack, a irmã dela e o namorado, no Genésio. E, pra esvaziar a borseta, eu precisava usar a privada... apesar de ter ficado ninja em esvaziar em situações não muito favoráveis, como banheiro sem privada... inclusive um que era só um ralo no chão! Mas se se tinha privada, eu preferia, né! E dessa vez, eu estava esperando fora do banheiro, e veio um cara e eu deixei passar. E o cara perguntou porque e eu “Ué, preciso usar a privada!”. E depois, outra vez encontrei o cara, e ele “de novo?”. Aí eu já quase mandei a merda né... mija aí e não enche o saco! Aí o animal vira e “meu, você está indo cheirar pó no banheiro, né?” hahah! Era o que faltava ouvir! Não estou tomando nem cerveja e ouço uma dessas!Acho que o cara deve ter pensado “esse cara, magrelão, fica se trancando no banheiro toda hora e sai rapidinho...”. Eu fiquei sem reação, mas a Jack falou que eu devia ter levantado a camiseta e mostrado, só pra ver a cara de bunda do cara! Mas eu preferi não humilhar. heheh
Bom, mas eu disse isso tudo, pra explicar o porquê de eu estar tão ansioso pra voltar. Estou muito curioso, um pouco com medo também, pra ver como vai ser essa retomada. Como vai ser tudo depois de tanta água que passou debaixo dessa ponte. Com certeza não é só voltar a fita pra onde o filme tinha parado. Aonde vão estar as coisas que fizeram minha vida... onde estarão as novas partes dessa nova vida... e que partes são essas. Eu tento construir já esse recomeço, mas não tem como. Só dá jogar quando o jogo começa, antes você pode treinar o quanto for. Mas treino é treino, jogo é jogo! Heheh E com tantas mudanças nesse percurso, não consigo imaginar como vai ser quando começar a fazer as equações com todos esses fatores. Quero ver o que vai ficar, depois de tantas voltas em cada aspecto da minha vida. Só sei que vai ser diferente. E espero que pra melhor! Mas, ao mesmo tempo, estou com muita, mas muita vontade de voltar e viver tudo! Quero pagar pra ver! Aliás, literalmente né... já paguei, mesmo, agora só falta ver! Heheh
Ah, e, claro, quero voltar logo pra ir nos jogos da Libertadores, né! Já vou perder esse de quarta-feira. Ano passado só perdemos porque eu não pude ir! Mas esse ano não tem erro! Aliás, pensa comigo: no ano que eu comecei a me ferrar, 2008, o Corinthians foi pra segundona. Aí, 2009, começamos bem, ganhando tudo e ficando bem na foto... Mas no fim do ano perdemos o fôlego e 2010 desandou! Agora que eu recuperei, naturalmente, seremos campeões da Libertadores. Não sou eu quem está dizendo isso. É a lógica dos fatos! heheh Vai curintia!  

sábado, 22 de janeiro de 2011

Faaala!
                Então, ontem teve a consulta com o Rodrigo. Antes eu fiz exame de sangue pra ver se estava tudo certo e deu que eu estou bem. Não tem mais nada me rejeitando aqui dentro!
                Na consulta com o Rodrigo ele preferiu não tirar o tubo. Achou melhor eu continuar com a nutrição pra engordar mais. Marcou de tirar o tererê no dia 27. Aí, se eu tiver engordado e tal, já marca pra tirar a borseta! Claro que, chato como só eu sei ser, insisti bastante pra tirar tudo ontem, já! Mas não o convenci. Na verdade, ele me deixa tranqüilo, por ser bem sensato. Acho que, dessa forma, as coisas ficam bem acertadas, cada um no seu papel. Eu, como paciente, quero tirar tudo rápido, ter alta de vez e voltar pro Brasil o quanto antes. Então, encho o saco dele, sempre. Claro, não tem como ser diferente. E ele, como médico, acho que entende, mas só me libera quando eu estive zerado e não precisar mais de seus cuidados. E eu sei disso, por isso fico a vontade pra insistir toda vez.
                Ele falou que, por enquanto, as 1500 calorias que eu tomo durante a noite pelo tubo, ainda são muito importantes. Tem aquela conta que se faz usando o peso e a altura, pra ver se está acima ou abaixo do peso. Eu ainda estou abaixo. Mas estou quase lá... não no meu peso ideal, mas em um peso mais seguro. Tem que ficar esperto, né, senão os órgãos ficam bravos!
                E antes da consulta, eu sempre fico esperando em um banquinho no corredor. Dessa vez, um cara sentou do meu lado e, não entendi muito bem como, ele sabia que eu era brasileiro. Falou do Rodrigo e começou a contar a sua história. Como foi ser atendido e não terminou de contar, eu perguntei pro Rodrigo pra saber direito. Chama Jimmy, o cara. Em 2005, ele se meteu numa briga e tomou 27 tiros! É, só 27! Chegou no hospital quase morto, teve que tomar aqueles choques no coração e tal. O Rodrigo salvou o cara, fez um transplante de intestino delgado e beleza. Mas, dois meses depois, o cara foi preso. Fez umas tretas com drogas, não perguntei o que. Mas, o Rodrigo falou que conseguiu seguir o tratamento. O cara ia de tempo em tempo ao hospital, e ficou beleza. Ficou três anos preso. Depois que saiu, ficou sendo preso e solto. Me falou que, nos últimos 10 anos, tem sido assim. Ele perguntou se eu tinha tido algum problema depois do transplante, e eu contei da rejeição. Mas o que ele queria era contar o problema dele. Em Janeiro do ano passado ele teve uma rejeição irreversível e teve que tirar o órgão. Indignado, falou que um dos médicos lá não queria o colocar na lista para novo transplante. Eu não sabia o porquê da rejeição e concordei com ele que, se precisa de transplante, precisa de transplante, ué! Mas, depois, o Rodrigo me contou que isso aconteceu porque ele parou de tomar o Prograf, que é o remédio mais importante, aquele que provavelmente eu tenha que tomar pra sempre.
O cara estava bem, achou que não precisava mais se preocupar com isso e, por conta própria, decidiu parar. Imbecil, vai! Depois de quase morrer, sofrer pra caramba, o cara fica com preguiça, ou, sei lá, acha ruim ter que tomar uma porra de um comprimidinho e caga tudo! E me falaram que essa é a principal causa de rejeição e problemas mais sérios pós-transplante. O transplantado parar de tomar o remédio porque acha que não precisa mais. E o pior é que rolam muitas questões éticas nessa situação. No caso do Jimmy, não querem autorizá-lo a entrar na lista de transplante, pois ele foi negligente com o órgão que recebeu. É bem complicado isso, porque agora o cara está sem intestino, com uma bolsa de gastrostomia (como a que eu tinha, que sai do estômago), dependente total de nutrição parenteral e não tem perspectiva de transplante. Ele tinha acabado de ter alta do hospital, há 18 dias. Ficou internado o ano inteiro, desde que perdeu o órgão. Me falou que pesava 110 kg, e agora tava pesando 53 kg. O cara é da minha altura.
Enquanto estávamos conversando, passou uma enfermeira e parou pra perguntar se ele estava feliz por ter saído e tal. O cara falou que estava com medo, que no hospital ele se sentia mais seguro. A enfermeira ficou meio sem graça até, com certeza ela fez essa pergunta imaginando que ele ia estar empolgado, já que todo mundo, quer ir pra casa, e não ficar internado. Mas fiquei imaginando. O cara, se já foi preso tantas vezes, não deve ter uma vida muito fácil. E é complicado pra caramba essa rotina de parenteral e tal. Tem sempre o risco de infecção, não pode vacilar com o cateter. É bem perigoso, mesmo. Eu sempre tive minha mãe, todos os recursos, e mesmo assim foi muito difícil. Nem imagino como o cara faz. E provavelmente sozinho. Pelo menos no hospital não tinha ninguém o acompanhando. O Rodrigo falou que ele é boa gente, mas que faz muita besteira e se mete em roubadas! Tem só 34 anos! Agora está nessas, brigando pelo transplante.
E parece que a lei está contra o cara, por ele ter vacilado. É como se ele tivesse já tido a oportunidade, e depois abriu mão, desencanou de viver. E tem o lance da grana também. Vai muito dinheiro num transplante. Só pra pagar o sistema que procura o órgão (que inclui, por exemplo, avião de plantão pra qualquer lugar, a qualquer hora) são 150 mil dólares por paciente. A sorte dele é que o Rodrigo parece que vai comprar a briga dele. Falou que, se ele se mantiver na linha, esse ano ele o coloca na lista de autorizados a receber o transplante.
Eu estava lendo, esse lance de transplante é um assunto cheio de discussões. Por exemplo, tem países que brigam pra impedir quem precisa de transplante de fígado por causa de bebida tenha esse direito. Eu não concordo. Mas o fato de o cara ser ou não preso não faz diferença na hora de ele ser considerado para receber um órgão. Só faltava né, porque aí seria como se a pena do cara, no caso dele precisar de um transplante, virasse pena de morte, né!
Mas esse processo todo envolve muita coisa. Lembro que, antes da cirurgia, eu assinei um monte de papel. Não estava nem aí, assinei tudo. Um que eu não gostei é o que eles chamam de Living  Wills. Eu não sabia o que era. O cara disse que é um lance dizendo o que você quer que aconteça com você caso você morra, ou vire um vegetal. Você pode ou não preencher. Eu não quis preencher, nem a pau! Sai zica! Tirando que ainda não decidi pra quem vou deixar meus milhões, preciso pensar melhor! Heheh Aliás, eu queria saber, de verdade, se eu posso ser doador quando eu morrer. Acho que não, né? Mas sussa, quem vai querer os órgãos de um velho de 90 anos? É, porque eu já decidi, vou morrer com 90. Se bem que, se meus órgãos tem 17 anos, são 13 anos mais novos que eu... então, acho que dá pra ir até os 103! É, vou bater o recorde da minha bisavó Tereza! Se bem que, falando em vó, a mais legal era a vó Mariquinha, que eu, quando pivete, adorava ver escovando a dentadura. Achava genial: “nossa, ela tira os dentes pra escovar! Muito mais fácil!”. Mas eu nunca conseguia fazer igual! Ah, sei que não tem nada a ver com nada falar da vó Mariquinha aqui (que não é minha vó, acho que era irmã da minha bisavó), mas é que eu lembrei dessa história. rsrs Eu lembro direitinho de correr pro banheiro da fazenda pra ver, admirado, ela escovar os dentes! E ela ficava até meio sem graça, tadinha. 
É isso aí! Beijo pra todo mundo!

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Oooooba!
                Bom, novidade, só amanhã! Hoje ainda estamos na mesma! Na verdade, agora estamos esperando o pessoal trazer um carro novo. O que a gente alugou está zicado! Deu problema com a bateria, de novo! Meus pais foram sair hoje cedo e nada, o carro nem tossiu! E como foi a segunda vez que isso aconteceu, eles vieram aqui e levaram embora o carro. Agora vão trazer outro. O pior é que essa confusão toda um dia antes de a gente devolver o carro!
                Na segunda-feira, eu fui tomar o remédio lá no hospital. Aquele que eu falei, que era a última dose pra zerar a rejeição. E isso rola em uma sala grande, que é onde são atendidos os pacientes de transplante que não estão internados, como eu. A mesma sala onde esperei pelo transplante. E dessa vez a sala estava bem cheia. Eu sentei em uma poltrona pra esperar e tinha uma mulher do meu lado, tomando uma medicação por um catéter no peito, igual o que eu tinha. Aí começamos a conversar. Ela disse que já tinha usado também esse tubo no nariz igual o meu. Mas pra ela era mais complicado, parece. Disse que não conseguia dormir e tal. Eu consigo! rs Ela tinha feito transplante de pâncreas em dezembro de 2009. Eu contei qual foi meu transplante e tal, e a conversa foi indo. Nessas, tinha uma mulher do outro lado da sala, de frente pra gente. Ela estava acompanhando a filha, e entrou na conversa.
Eu já a tinha visto antes, naquela sala mesmo, e tinha me chamado a atenção. A filha dela, além do lance do transplante, tinha algum outro problema. A menina, que deve ter uns 18 anos, é bom miudinha, aparenta uns 12 anos pelo físico, e não fala. Fala com a mãe por sinais, e de um jeito meio agressivo, gestos meio bravos. A mãe dela começou então a falar. Disse que a filha tinha vivido por quatro anos sem dois terços do intestino delgado. Depois ficou mais quatro meses sem intestino nenhum, igual a mim. Não sei o que rolou pra dar nisso. E ela fez um transplante parecido com o meu, menos o estômago e o pâncreas, em março do ano passado. Acho que ela deve ter esse problema desde muito cedo, e não pôde se nutrir direito bem nas fases mais importantes do desenvolvimento. E isso impediu que ela tivesse a formação correta de vários lances físicos e mentais. É o que eu acho.
Eu sou bem observador, assim, não tem jeito, fico olhando em volta, imaginando as coisas... Essa menina ficava o tempo inteiro, mesmo enquanto dormia, mexendo com a perna, empurrando a perna da mãe, uma mulher bem gorda, de uns 40 anos. A perna da menina não parava um segundo. E ela não largava seu celular verde e brilhante. Mandava mensagens e quase pulava da poltrona ao ouvir o bip de uma resposta. E era impressionante, ela dormia com a perna empurrando a mãe, e a mão firme segurando o celular. E eu fiquei muito curioso, até por aquela menina ser a primeira pessoa que eu conheço que viveu sem intestino também. Mas não podia sair perguntando. Apesar de a mãe dela estar desesperada por uma conversa. Acho que ela devia viver em função dessa filha há uns 10 anos, e com isso se isolou e não tem muita vida social. Então, só quando ela vai ao hospital é que encontra pessoas.
Ela ficava falando e puxando papo com todo mundo. Mas sempre com a filha como assunto. Imagino que, talvez, ela nem tenha outro assunto, na verdade. Aí fiquei meio assim, será que a menina percebe ou nem se liga que a mãe fica falando dela pra todo mundo. E falava sempre com um sorriso no rosto. Um sorriso meio forte, contínuo e tenso, não entendi direito. Parecia que queria mostrar que estava bem, ao mesmo tempo que precisava desabafar, sei lá. Eu não entendia ela ter essa angústia, essa idéia de querer transparecer algo, pra pessoas que ela nunca tinha visto.
Claro que não tenho nada a ver com a vida dela, mas achei triste e pensei se ela não expunha demais a filha anunciando o que rolava pra quem estivesse por perto. Só que tem o outro lado, a vida da filha dela era a vida dela... então é complicado. Mas, por exemplo, eu não acharia legal minha mãe ficar contando minhas tretas pra todo mundo, gente que eu nem conhecia, comigo ao lado! Se eu não estou, tudo bem, claro, pode falar o que quiser, pra quem quiser... ainda mais se isso fizer bem pra ela. Mas, comigo junto, eu ia me incomodar, eu acho.
É difícil achar o caminho certo pra levar uma situação dessa. Você tem que se preocupar com todos os aspectos da saúde, mas não pode esquecer da relação com a pessoa, né. A cabeça fica muito frágil... vulnerável mesmo. É perigoso. Tem que tomar cuidado pra não gerar outro problema. E tem essa relação pessoal também, do dia a dia, a rotina. Pra ficar só na relação mãe-filho, não sei dizer o que é pior: ter uma doença que exige transplante, ou ter um filho com uma doença que exige transplante. Conheço minha mãe, ela com certeza preferia estar passando por isso ao invés de me ver sofrendo. Assim como eu agradeço que sou eu quem está vivendo isso, e não ela. Mas é tudo muito delicado, cada lado sofre de uma forma e tem que lidar com sua dor. Não tem jeito. E não dá pra comparar. Eu nem imagino a dor de uma mãe. E é foda, assim como eu não tenho como fugir, isso está acontecendo comigo, ela também não tem opção, é com o filho dela o problema! Na verdade, não, acho que quem não tem opção mesmo sou eu. Ela optou! Escolheu vir comigo, em todos os sentidos. Por isso que eu digo que ela que é a guerreira. Mas se você fala isso pra ela, ela diz “ah, mas eu sou sua mãe, Renato, que mãe não faria isso?” Mas não é tão simples assim, não. Eu acho que muita gente não tem a sorte que eu tenho. E das mães que tem a moral de encarar, muitas não devem dar conta! É, porque não é cuidar de um filhinho gripado, não! Tirando que, às vezes, eu fico num mal humor que eu não sei como ela aguenta! Nem eu me aguento! Só a minha véia mesmo!  
Mas voltando pra sala de espera. A mulher do meu lado, que fez o transplante de pâncreas estava esperando por um rim. E essa necessidade era por complicações nessa cirurgia. Eu perguntei se ela não tinha algum parente que pudesse doar, pra não precisar ficar na fila. Porque essa é uma vantagem do transplante do rim, já que temos dois e é possível viver tranqüilo com um só. O lance é achar alguém compatível e já era. Ela disse que o filho dela estava fazendo os exames pra ver a compatibilidade e tal. E aí aquela mulher entrou na conversa de novo. Olha a história que ela contou. Uma prima dela teve problemas sérios no rim por uns vinte anos, e precisava de transplante. Estava na fila, mas não achava doador. Uma irmã então se ofereceu e passou a fazer os exames pra ver se era compatível. Parece que é uma porrada de exame, a pessoa passa um tempo fazendo. No fim, deu que havia a compatibilidade necessária pra doação. Notícia boa né, legal. Aí, na hora de acertar as coisas e tal, a irmã vira e fala pra outra “É, mas a gente não se dava bem quando era criança, então porque eu vou te ajudar agora? Não vou doar, não!” E, depois de um tempo, sem conseguir doador, a mulher morreu! Sério! Barbárie, né?! E outra, além de ruim, essa irmã é doida né, fez todos os testes pra chegar na hora e não doar?!
E já que estou falando de pacientes e tal, tem um vídeo que o Rodrigo me mandou logo no começo, quando eu ainda estava no Brasil, agilizando a viagem. É sobre um cara que teve um problema parecido com o meu. A diferença é que ele teve um pouco mais de “sorte”. Chegou ao médico certo antes, logo que começou a ter problemas, então não precisou de transplante. Mas pelo o que eu li (a mulher desse cara fez um blog), se ele não operasse logo, provavelmente teria tido complicações maiores, parecidas com as minhas.
  E também, por esse vídeo, vocês podem conhecer o Rodrigo! De repente já dá pra ir tirando os moldes pra fazer a estátua! Heheh
É isso aí! Beijo pra todo mundo

terça-feira, 18 de janeiro de 2011


Faaala!

                Opa! Tudo certinho? Por aqui, tudo bem! Hoje fomos no hospital. Foi o último dia do remédio que eu tava tomando pra passar aquela zica da rejeição. E já aproveitei pra conversar com o pessoal lá. O Rodrigo está gripado e não pôde ir. Também, só faltava pegar uma infecção do meu médico, né! Com todos esses lances de imunosupressão, riscos de infecção e tal, é bom ele nem passar perto do hospital! rs Mas é tranqüilo, ele não precisa estar sempre presente, tem vários médicos lá, e a maioria me conhece e tal. Não sei qual a diferença entre eles. Vou perguntar a próxima vez. Me parece que cada um é especialista em um tipo de transplante... mas todos entendem de tudo, pelo menos o suficiente pra te atender numa consulta. Acho que é isso.
Aliás, eu acho que já conheço todo mundo naquele hospital, das enfermeiras aos médicos! Lembro quando cheguei aqui, quando tudo era estranho, eu sempre me perdia no hospital, achava imenso tudo lá. Até escrevi disso, de como era bom estranhar tudo, já que não é legal se sentir em casa num hospital, como, na época, eu me sentia no Sírio. Mas, eita, agora eu ando por aqui e tem enfermeira que fala até “e aí, beleza!”, quando me vê! É, meu! Hoje, enquanto estava na sala esperando o remédio, o pessoal passava e perguntava como eu estava, puxava papo e tal. Aí que eu comecei a pensar nisso. E já falei né, não gosto muito dessa história de ser conhecido em hospital. É legal na hora, o carinho né, dá uma sensação boa... beleza. Mas, meu, bom mesmo era quando eu me perdia nos corredores, quando olhava pra minha velha e “não mãe, é pra cá... eu acho”, e claro que não era! Heheh Sei não, quando você começa a conhecer e ficar muito conhecido num hospital, é hora de ir embora, viu! E pra minha casa, mesmo, me sentir em casa lá!
Não posso reclamar muito daqui, não. Fomos muito bem recebidos, o apê é legal, a cidade é muito legal, bonita mesmo, o pessoal do hospital... tirando o bedelzinho do mercado e o frio, foram todos muito receptivos e ajudaram muito a gente aqui! Mas já deu, logo mais faz cinco meses que estamos aqui! O problema é que digo já deu por mim, mas o que importa é o que os médicos e meu corpo dizem. O que vale é o tempo deles, né... é aquela velha história “tem que ter paciência, tem que pensar que isso, que aquilo... “. Puta saco, é muito chato ter que pensar em coisas, tendo que me convencer. Acho que até fiquei bom nesse lance de, as vezes, me enganar mesmo né.... mas cansa! Na verdade, acho que o negócio pra ter paciência não é pensar nisso ou naquilo. Acho que o esquema é não pensar em nada, na verdade. Porque a gente não é trouxa pra ficar se enganando, sempre. Pode tentar... na verdade, todo mundo, ou a maioria das pessoas, está sempre tentando! Mas mentir pra si mesmo é muito mais difícil. Então, o que o que eu faço é deixar a cabeça vazia, mesmo. Fico pensando em outras coisas, tipo o que vou fazer quando voltar, vejo umas paradas na internet, televisão (tem um canal aqui que fica passando umas vídeo cassetadas o dia inteiro! Repete pra cacete, mas é animal!), acompanho as notícias do meu Corinthians, e vamos indo. Mas acho que já falei disso, aí o chato vai acabar sendo eu! Então deixa pra lá, o lance é comemorar que já foram quase 5 meses, que eu estou aqui e tal. Aliás, ontem, dia 16 (ainda não dormi, então ainda é dia 17!) fez 3 meses da cirurgia! Passou rápido, né!
E essa sexta-feira parece que vai fazer 18 graus negativos aqui! Sério! E aí, ainda vão reclamar que está muito calor aí, no Brasil? Vem pra cá então, aí eu levo pra dar uma volta... levar uns tombos na neve. Aliás, o tombo é o oi da neve, né, logo que você chega, felizão por ver a neve e tal. O Dú, logo que chegou, deu oi pra neve de bunda! heheh. Aí, pra sair de manhã, tem que tirar um metro de neve do carro, com uma brisinha gostosa na cara e a mão quase necrosando. Não adianta tentar jogar aquele jatinho d'água no pára-brisa pra enxergar alguma coisa... a água virou gelo. Mas beleza, depois de passear e ver a paisagem, que fica mesmo muito bonita,  você chega em casa. Que gostoso, quentinho... mas vai tentar tirar o sapato! Você não consegue mexer um dedo! Sério, é como se tivesse inteiro enfaixado, de tanta roupa! Ah meu, não dá! Com certeza já houveram descrições mais animadas do inverno e tal. De repente, na primeira semana de frio eu teria sido mais romântico no meu relato... Mas o que posso dizer é que não nasci pra viver num frio desses, não! Ah, lembrei de uma coisa legal desse frio. Quando você vai ao mercado, não precisa se preocupar em voltar logo pra casa pra por as coisas no freezer! E a água que você esqueceu no carro na noite anterior vai estar geladinha, é só esperar descongelar!
Voltando à consulta de hoje. Eu estava meio que na expectativa de alguma novidade... sei lá, marcar a cirurgia pra tirar a borseta, ou, de repente, tirar o tubo do meu pequeno nariz. Só que não foi ainda dessa vez. Mas tudo bem, mesmo assim teve notícia boa. Engordei 1,5kg. Na verdade, o lance mais importante foi ter parado de emagrecer. E dá uma tranqüilidade saber que estou engordando. Também, estou mandando ver nessa nutrição. Claro né, já que coloquei essa porcaria desse tubo, vamos usar! Estou ficando 12 horas por dia com a nutrição correndo. É sussa, não fico enjoado, nem nada. O que enche o saco é o tubo no nariz e na garganta. Imagino que você não tenha tido a oportunidade usar, mas dá pra ter uma idéia, é só imaginar um tubo do tamanho de um spaghetti na garganta, você engolindo a comida e a parada ali, atrapalhando o tobogã! Mas quando eu não estou comendo, até que dá pra acostumar. Às vezes eu nem lembro que estou com ele e até tomo susto quando olho no espelho. Ah, falando em susto, outra hora que eu sempre lembro que estou com o tubo é quando cruzo com pessoas, principalmente no hospital. Eu sei que chama a atenção um tubo pendurado no nariz. Mas não é isso, o que eu acho até meio engraçado é que as pessoas passam, olham e fazem uma cara com um sorrisinho. Sabe aquele sorriso de boca fechada, meio de educação? Como se a pessoa, ao me ver, já criasse um laço comigo, a ponto de achar importante dar seu "parecer". Então ela passa e dá o sorrisinho que pode significar muitas coisas. Eu tenho um monte de interpretações, pode ser um "puts, que merda esse tubo, hein!", ou então só um “fala, ô do tubo!”. Tudo bem, não me importo, mesmo. Não posso esperar não chamar a atenção com esse tererê exótico! Eu olharia também! O que me incomoda, na verdade, é que parece que as pessoas olham e se sentem na obrigação de dar um retorno sobre o que acharam! Doido, isso! Porque, assim, é normal você estar andando e cruzar com pessoas, cruza olhares, claro, não dá pra andar só olhando pro chão. Mas se você não conhece, segue andando e boa. E hoje eu reparei, as pessoas me olham e não seguem em frente, apenas. Elas olham, fazem o sorrisinho enigmático e continuam. Vai entender. Será que eu também faria essa cara de bunda ao ver alguém com um tubo igual o meu?
Aliás, falando nisso, de as pessoas olharem, eu vou me divertir com as minhas cicatrizes, né! É, porque vai chegar uma hora que eu vou cansar de contar o que aconteceu e tal. Falam que tem plástica pra isso, mas nem a pau, acho besteira, eu tenho é orgulho! Então, nossa, vou inventar várias histórias! Imagina, meu neto contando pros amigos “É meu, meu vô foi assaltado por uns cinco caras, todos com faca! Levou facada em tudo quanto é canto, igual aquele filme lá! Sério, pergunta pro meu irmão! Aí, aí, como ele não morria, os caras ficaram assustados e saíram correndo! Ah, e ele mesmo que deu os pontos, ali na hora! É, sem anestesia, meu!! Com o que? Ah, isso eu não sei, tenho que perguntar pra ele... “ heheh.
                E voltando pra consulta, mais uma vez. A outra notícia boa é que a rejeição está controlada. Minha pele já voltou ao normal, não estou mais com marcas no rosto e nas mãos. Também estou me sentindo bem melhor, mais disposto e tal. Agora o lance é continuar com a nutrição e comer o máximo que der. Eles se animaram com o fato de eu ter engordado e querem que eu continue nesse esquema pra ganhar mais peso. Na quinta-feira eu volto lá pra ver. A outra notícia boa é justamente essa, que, agora, eu volto só quinta-feira pro hospital! heheh É, porque estava lá indo todos os dias desde terça-feira!
                É isso aí! Um beijo pra todo mundo!

sábado, 15 de janeiro de 2011


Ooooopa!

                Então, os últimos metros da corrida aqui estão meio complicados. Não é só acelerar e mandar ver no sprint final. A estrada ficou meio ruim de andar. Mas estamos indo... devagar, já que temos que respeitar o ritmo do corpo.
                O que está rolando é o seguinte. Eu não consegui ganhar peso nessa última semana. Se engordei foi não mais que um quilo. Aí, na 3ª. feira eu fui ao hospital fazer exame de sangue, tomar o Cytogam e conversar com o Rodrigo. E também quis ver o que estava acontecendo, pois estava com a pele bem estranha, seca e com vários cravos, uns lances no olho. A minha mão também, estava com umas marcas vermelhas que parecia alergia. O Tony, que é um enfermeiro que faz tudo aqui, veio falar comigo. Faz vários procedimentos. Ele que trocou, e depois tirou o tubo de enteral, por exemplo. Ele veio falar que tinha marcado dermatologista pra mim às 11h e que ela iria fazer biópsia pra ver o que era.
                O Rodrigo também perguntou se eu tinha ganhado peso, mas engordei no máximo 500 gramas. Aí ele falou que eu teria que pôr um tubo de nutrição de novo, pois estava muito magro, que isso podia dar merda e tal... enfim, eu tinha que engordar logo. E, pra isso, precisava de muito mais caloria do que era capaz de ingerir.
                Na dermatologista, ela olhou e disse que, provavelmente, aquilo era causado por um dos remédios que eu estava tomando. Um pra não dar um tipo lá de pneumonia. Mas que já nem era mais necessário, e falou pra eu parar de tomar e me deu uma receita de uma pomada e um remédio pra coceira. Fiquei tranqüilo porque ela disse que não tinha nada a ver com o transplante, e que nem precisaria de biópsia.
Quando o Rodrigo ficou sabendo, achou estranho ser por isso e pediu uma biópsia, que o Tony, claro, veio fazer. Biópsia de rash, que é como eles chamar esse lance que parece uma alergia, é assim: o cara vem com um tubinho que meio que morde sua pele e tira uma camada do objeto a ser examinado. Mas você nem sente. Ruim é antes, quando ele dá umas 3 ou 4 injeções em volta pra anestesiar. O resultado sairia na 5ª. feira, mas ele já mandou aumentar o cortisona, de 2,5 pra 20mg.
Na manhã de quarta eu fui lá colocar o tubo. E como já tinha cicatrizado a barriga, tive que colocar pelo nariz. Muito ruim, meu. Não rola anestesia... O cara coloca um gel pra deslizar melhor lá dentro e manda ver! No nariz, pô! Heheh. A parada vai até o intestino delgado. O chato é que eu fico com um tubo pendurado no nariz. E incomoda porque passa pela garganta. Mas, pelo menos, durante a noite eu já tomei a nutrição, que é a mesma que eu tomava antes pelo estômago. Foi tranqüilo, só levantei mais vezes a noite do pra ir ao banheiro. Sussa, foi pra matar a saudade de uns meses atrás! heheh
Na 5ª. feira voltei lá pra ver com o Rodrigo o resultado da biópsia. O que rolou, na verdade, foi um princípio de rejeição dos órgãos. Mas ao contrário. Ao invés de eu rejeitar os órgãos, eu fiquei fraco e os órgãos, que estão bons, começaram a me rejeitar! Tem um nome isso, mas eu não lembro. Doido isso né, porque os remédios que eu tomo são, a maioria, pra tirar a minha aos órgãos. Aí o Rodrigo ficou sério. Já fiquei lá no hospital pra tomar uma dose de cortisona na veia. Vou tomar todo o dia até 2ª. feira. Esse é o tratamento. Tomei hoje de manhã de novo a dose lá, e já fez efeito, deu pra sentir uma diferença. E o fato de eu não estar comendo já era devido à rejeição. Não era tanto da cabeça!
Essa, pra mim, foi uma notícia boa nessa zica toda! É, porque mostra pra mim que não estou tão atrapalhado quanto achava. Tanto que, desde ontem, estou comendo melhor do que estava antes. Mesmo com esse tubo na garganta. E sinto mais bem disposto e tal. Agora vou ficar com esse tubo até ganhar uns quilos, suficientes pra tirar o borseta. É bom também  porque agiliza essa engordada logo. E quando tirar o tubo vai ser bem mais fácil voltar a comer. Vai ser igual a história dos bodes que a vó Chafia contava. Ou era o vô Aiçar? Que tinha uma menina que reclamava com a mãe que a casa era muito pequena. Aí a mãe foi lá e colocou um bode no meio da sala. E perguntou pra filha como estava agora. “Ah, nossa, agora piorou! Que horrível”. A mãe foi lá e colocou mais um bode. “Ah, agora tá muito ruim, não dá”. E ela colocou mais um. A filha reclamou mais ainda, claro. Depois a mãe tirou um bode. A menina “Ah, tá menos ruim”. Tirou mais um. “É, melhorou um pouco agora”. E quando tirou o último bode, “Nossa, agora tá ótimo, essa casa é muito gostosa, olha que espaçosa e tal”. Heheh, boa né? Mas o legal é a minha mãe contando, com calma e saudosa. Mas então, com o lance do tubo de nutrição é a mesma coisa, vai ser um alívio muito bom comer sem aquele troço na garganta. A volta do prazer de comer... eu acho!
E a dermatologista, maior sem noção. Não pede nenhum exame e dá o diagnóstico errado! Pra ver que médico ruim tem em todo lugar né... se bem que essa foi a primeira que eu conheci aqui. Mas ainda bem que o Rodrigo se ligou. Na hora que eu falei o que a dermatologista disse ele já desconfiou e pediu a biópsia. Agora é sussa, tomara que eu engorde logo. Vou me pesar na 2ª. feira, quando acaba esse tratamento... vai que já engordei e posso tirar o tererê do nariz e a borseta da barriga!
                Ah, foram dias corridos, tensos... com muita informação. Mas agora me vejo mais tranqüilo do que antes de começar essa semana. Antes eu estava meio preocupado porque não melhorava. Eu me esforçava, mas não era suficiente. Agora eu sei o que estava acontecendo, estamos resolvendo e eu já me sinto melhor. Ou seja, as coisas estão sob controle.  Eu to mandando ver nessa nutrição, são duas mil calorias por noite que eu tomo na parada! Mais o que eu como, devo engordar rápido... espero. E serviu também pra eu ficar esperto. O negócio não é brincadeira. É, porque só esse comecinho de infecção já me deu uma quebrada forte. O Rodrigo disse que quando vai pro corpo inteiro essa “alergia”, aí é um abraço, não tem mais jeito. A minha pegou as mãos e o rosto, só. Ah, e minha mãe, que está sempre pensando em alguma coisa, tava preocupada com um e-mail de Agosto, o primeiro que o Rodrigo nos mandou, em que ele diz que 95% dos pacientes voltam a ter uma vida produtiva, normal. E ela queria saber se eu estava nos 5%. E ele disse que não, que estava tudo certo com os órgãos. Que quando estivesse tudo controlado, eu ia embalar e pronto, já era! Não que eu achasse que pudesse ser um dos 5%, mas é sempre ouvir do médico, né! Ouvir coisa boa não incomoda! É igual ouvir eu te amo da mulher que você ama, né! heheh Viu Jack, como eu sou romântico!
                Mas é isso aí, entre mortos e feridos, salvaram-se todos! Mas sério, o que eu me liguei com isso foi que o corpo avisa. Qualquer coisa que acontece, na hora ele reage. O lance é aprender a ouvir seu corpo, a ler esses sintomas e tal. Por isso, também, que médico tem que ter tempo de estudar. Sempre, mesmo depois de formado. Essa é a diferença dos médicos daqui, pelo menos os desse hospital. O Rodrigo sempre falou: aqui, ou eu estou fazendo transplante, ou eu estou pesquisando e estudando sobre o assunto. Há 11 anos. Por isso que ele bateu o olho e já matou o que eu tinha. Já no Brasil isso não rola, eles não dão a estrutura pro cara se focar nisso. No hospital privado, onde tem grana e estrutura física, não tem a garantia de um salário. O cara tem que fazer várias cirurgias de apendicite, por exemplo, pra tirar uma grana. E no sistema público tem a estrutura de salário que permitiria o estudo e evolução do médico, mas não tem os recursos, os aparelhos e tal. E o salário do médico no sistema público é aquela coisa. O lance é uma mistura dessas duas realidades, né. O Einstein com o HC! E, vendo a diferença, o que essa cirurgia é capaz de fazer nos dois países, fica claro que esse é o caminho. E nem se gasta mais dinheiro pra isso. É só gastar certo... planejamento, ué!
            E outra coisa: como ninguém lá no governo deu um jeito de trazer o Rodrigo pro Brasil! Os caras já gastaram uma nota, porque a justiça mandou eles pagarem vários tratamentos aqui nos EUA, por que o Brasil não faz. E só aí começaram a ficar preocupados. Mas não com a saúde de tanta gente que precisava vitalmente do transplante mas não tinha como vir pra cá. Essas pessoas tinham duas opções: ou morrer na mão de um médico despreparado, como uma cobaia mesmo, ou morrer devido à doença que exigia o transplante.
                O governo, preocupado com os altos custos dessas viagens de quem tinha recursos de ir brigar na Justiça, começou a se mexer pra começar a oferecer esse tratamento por aí. Inclusive, se você der um Google em “transplante de intestino”, vai ver que um monte de site especializado deu muito destaque para a notícia veiculada no Diário oficial, no fim de 2009, dizendo que Brasil estava preparado para fazer tranplantes de intestino. Provavelmente começaria no início do próximo ano, 2010. Então começaram a preparar a equipe. Mas é muito complicado, complexo, pois é o tipo em que o controle da rejeição é uma equação difícil de dar certo. Começaram a mandar médicos pra cá pra aprenderem as técnicas e tudo o mais. A maioria vem fazer estágio com o Rodrigo, mesmo. Eles vêm e ficam, no máximo, uns 3 meses. Tem us que ficam 1 semana! Mas meu, o cara mexe a 11 anos com isso, e os caras querem aprender, fazer igual a ele, com uma semana, três meses? É a mesma coisa de um cara querer passar uma semana comigo e achar que vai virar um grande anedotista! Não é assim, tão simples! Heheheh
                Mas o lance é que eles gastam muita grana errada. Mandar esses médicos todos pra cá, pagar todos esses tratamentos que eles perdem na justiça... vai dinheiro pra caramba. E o pior é que o cara que mais entende disso, talvez no mundo, o Rodrigo, é brasileiro. E se fizessem uma proposta de verdade, oferecendo a estrutura necessária, duvido que ele não aceitaria. Aposto que ele voltaria pro Brasil pra começar a fazer aí. Ele está aqui por que é aqui que ele tem as condições pra fazer o que ele sabe. Mas ele sabe o tanto de gente que precisa desse tratamento, e aqui o pessoal já pode se virar sem ele, eu acho. Mas não, a galera aí parece não estar muito preocupada.
               O que dá raiva é que colocaram em tudo quanto é canto que vai começar ter esse transplante no Brasil e tal, e deixou um monte de gente cheio de esperança. É triste isso, bem triste, porque, pelo que parece e o que falam aqui, vai no mínimo uns 10 anos pra rolar essa mudança de estrutura que precisa, e, principalmente, a mudança na mentalidade da medicina, pra permitir essa evolução dos profissionais, que são fatores essenciais pra  poder oferecer esse tratamento. Outra coisa que atrapalha também é colocarem muito político pra comandar a saúde, né. Os caras tem outra visão, se preocupam com a imagem do ministério que comanda, às vezes gastam até mais com comunicação que fazendo o que interessa mesmo... é, é aquela beleza que orgulha tanto a gente né! Politicagem com cargos tão importantes é foda. Mas aí, vixi, é outra conversa... vai longe, mas vou parar por aqui porque tá tarde e acho que escrevi demais!
                Valeu por ter lido até o final! Heheh
                Beijo pra todo mundo!