segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Faala!
                Então, esses últimos dias estão sendo bem... puxados, vai, vamos chamar assim. Não gosto de pensar que agora era pra eu estar aí no Brasil, na minha casa, a única que eu chamo de lar, mesmo. Eu tenho uma casa aqui, onde até me sinto bem, afinal dia dois de março completo seis meses aqui. Mas não tem jeito, meu lar é mesmo na Bandeira Paulista, 147, apto. 104, São Paulo. Foi lá que eu nasci, cresci, me desenvolvi e virei eu. É muito difícil lidar com a falta desse lugar. Eu não uso, acho que nunca usei essa palavra “lar”. Mas uso agora por todo o significado que ela traz, no sentido de porto seguro, acolhedor. Enfim, ela simboliza, de certa forma representa, tudo o que deixamos pra trás para eu ter minha vida de volta. Todas as pessoas que amamos, toda a rotina que, por mais corrida que fosse, sempre terminava ali, na Bandeira Paulista. É muito doído pensar que a essa hora eu poderia estar dormindo na minha cama, na minha casinha.
                Mas não, ao invés disso, estou aqui na cama do hospital, e minha mãe nessa poltrona “quero-ser-cama-mas-não-consigo”, aqui do meu lado. E eu continuo naquele esquema, se dá pra complicar um pouquinho, eu já aproveito e complico bastante! Dessa vez foi o seguinte: ontem (sábado) vazou um monte de porcaria (pra ficar em termos mais polidos) pelo buraco do dreno. O dreno não estava drenando nada. Eu acordei as 5h da manhã, todo sujo, com o curativo “nadando” em... porcaria, né, vamos manter a classe! E tinha uma enfermeira do meu lado, com uma cara de... ânus, vai, e falou: “é eu estava esperando você acordar”. Como assim, esperando eu me sujar mais? É, porque a cama estava suja, se eu virasse pro lado ia ser uma beleza! Mas tudo bem, eu comecei a me limpar. A enfermeira não mexia um dedo, se minha mãe não estivesse ali pra me ajudar, eu estava ferrado. Essa inútil dessa enfermeira ficava chamando outras enfermeiras pra mostrar e dizia: “olha, você está vendo, é isso que está saindo, olha só”. Sei lá se ela estava com medo de ser a responsável por algo. Só sei que ei me senti um palhaço no circo. Ela chamou umas quatro enfermeiras, e todas olhavam, faziam a cara de ânus e saíam. Eu fiquei um bom tempo me limpando. Porque mesmo depois que terminei, eu apertava em volta e saía mais coisa. Então fiquei apertando até parar de sair, senão não daria pra fazer um curativo. E eu queria tirar a roupa que estava bem suja, nojenta. Acho que demorou quase uma hora. E como não tinha mais roupa limpa, peguei uma calça do hospital, mesmo. Olha, foi um jeito muito gostoso de acordar.
                Umas 7h chegou um médico. É um eslovaco muito gente fina, mas o inglês do cara é pior que o meu! Ele parece que está bravo, os dentes não se desgrudam enquanto ele fala, é muito difícil entender. Ele chegou, viu a treta e falou que precisaria cortar pra ver direito porque o dreno não funcionava. E fez isso aqui no quarto mesmo. Me deu umas injeções de anestesia local e meteu o estilete. Odeio essas anestesias locais. Você sente tudo, anestesia só mais ou menos. Eu não olhei, mas parecia que ele estava mexendo com o dedo, sei lá. Ficou uns vinte minutos fuçando. Doía bem. Minha cama ficou toda suja de sangue. E ele pediu pra eu fazer uma tomografia. Fiquei então tomando contraste, e também uma dose de potássio, eu acho. Meu, isso é horrível, é puro sal, muito mesmo, disparado a pior coisa que já bebi. E lá pra umas 11h30 fiz a tomografia. Um pouco mais tarde, o médico veio e falou pra eu não comer mais nada, pois o caso era de cirurgia. Meu intestino tinha uma fístola (é um buraco). Eles teriam que me abrir, pois estava vazando merda do meu intestino. E tentariam fechar esse buraco. Mas principalmente, iriam limpar, pois era isso que estava me causando tanta febre e poderia gerar uma infecção perigosa. Antes de eu ir pra cirurgia o Rodrigo veio aqui. Disse que provavelmente essa fistola tinha sido gerada durante a última colonoscopia. O cara que fez foi sem noção. Na hora de jogar ar, ou água, ele fez com uma pressão muito forte. E como eu tinha acabado de tirar a borseta, a região estava frágil, com pontos, e acabou abrindo um buraco ali. O Rodrigo falou que iria tentar fechar esse buraco, mas que não seria fácil, pois o meu intestino estava muito danificado, e talvez não agüentasse os novos pontos. Seria como dar pontos em uma manteiga, ele disse. E havia o risco de precisar colocar de volta a borseta! Essa hora eu fiquei com medo. Logo depois eu fui pra cirurgia. Durou quase cinco horas. E quando acordei, ainda na sala da cirurgia, queria saber o que tinha acontecido. E as enfermeiras: “não podemos falar, sua mãe esta informada, logo você vai pro quarto e fala com ela”. Aí eu comecei a me “examinar” e vi um tubo saindo do meu nariz, um da minha anaconda, um dreno na barriga, e um puta curativo gigante na barriga. Pensei: “fudeu, com tudo isso aqui, deu merda, certeza, e essas enfermeiras não querem me dar a notícia. Se fosse notícia boa elas falavam!”
Aí eu fui pro quarto e conversei com a minha mãe, que tinha falado com o Rodrigo. Ele falou que foi uma cirurgia muito difícil, mas que não precisou colocar a borseta de volta. Quando ele disse isso, ela deu um puta abraço nele! hahah Tadinha, estava desesperada. Era o que ela estava com mais medo. Eu também. Ele falou que teve que tirar um pedaço final do meu intestino. Pelo gesto com a mão, foi uns 10 cm. Pois é, mal coloquei o intestino novo, e já teve que tirar um pedaço. Mas não foi nada de tumor, foi o imbecil do cara da colonoscopia, que fez o exame com uma delicadeza de açogueiro! O Rodrigo aproveitou e olhou os órgãos, disse que está tudo ótimo, mesmo o intestino, que só ficou um pouco menor. O Tubo no meu nariz é um dreno, pra manter meu estômago vazio. O lance na minha anaconda eu tirei hoje a tarde. Só que, agora, arde pra caramba pra fazer xixi. Mas sussa, isso rola em toda cirurgia, e vai melhorando aos poucos. O tubo no nariz ainda vai mais uns dias, assim como o dreno aqui onde estava a borseta. E estou naquele esquema sem poder nem beber água. Devo ficar mais uns dias assim também. Só no soro, um monte de antibiótico e os remédios que eu já tomava. Pra dor eu estou tomando 8mg de morfina, a cada três horas.
Mas o pior de tudo isso não é nada no físico. Eu sei que vou ficar bom. O que me deixou mal é que atrasou ainda mais minha volta. Eu sei que agora deveria pensar mais é na minha saúde, na recuperação e tal. Mas não consigo. E ele não falou de quando posso voltar, mas já disse que antes do meu aniversário é impossível. Isso foi foda. Eu tinha muita esperança de passar meus 30 anos aí! As vezes parece que não vou voltar nunca! É impressioante! Agora eu fiz uma cirurgia, que só pode ser considerada pequena se comparada a um transplante! Então tem um tempo de recuperação, aquela encheção de voltar a comer, dor na barriga, o corte. É começar do zero, de novo. E daquele jeito, respeitando o tempo lerdo do corpo. Não adianta ter pressa. Mas é difícil. Como não ter pressa? Rola um descompasso enorme entre o corpo e a cabeça. E eu fico o mais perdido no meio disso tudo. Eu tento, mas é muito difícil estabelecer uma harmonia aqui. E eu continuo sem saber quando eu volto, mas agora com prespectivas bem piores. Sei que não devia ficar pensando nisso, me concetrar na minha recuperação e tal. Mas é impossível! Não tem como! Ainda mais hoje, que era pra eu estar na minha cama, do lado de quem eu amo. É como minha mãe disse, parece que não cansam de testar nossa força. É uma paulada depois da outra. Não sei mais nem o que falar, porque eu já estava bem triste com isso no começo da semana. Mas agora o tombo foi ainda maior. Ao invés de entrar na sala de embarque do aeroporto, eu entrei na sala de cirurgia.
Bom, por enquanto é isso. Torçam aí pra não acontecer mais nada de ruim! De verdade, não digo isso pra voltarmos logo. É que não estamos agüentando tanto tapa na cara assim. Está demais. Quando a gente acha que acabou, vem uma mão mais pesada ainda! Vou dormir, porque logo mais vem a enfermeira tirar sangue. Todos os dias, as 4h30, tiram sangue pra exame. E eu estou muito mal-humorado, então não vai ficar muito agradável esse texto. Melhor parar aqui, até porque já escrevi demais, né!
Valeu todo mundo. Um beijo grande!

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

EPOPÉIA 14

Ooooopa!
Primeiro quero agradecer as mensagens que vocês mandaram! Muito bom, mesmo, ler esses recados, principalmente nessas horas. E agradeço ainda mais pela minha véia! Ela ficou super emocionada e tal, até chorou! E um recado para minhas tias e amigas da minha mãe: Mandem mais e-mails pra ela, po! A Santinha está carente! Agora que ela está toda interneteira (palavra cunhada pela própria!), ela está adorando mexer no computador! E o que ela mais gosta é de ver os e-mails. Sério, ela entra toda hora pra ver se tem alguma mensagem! E fica super frustrada quando não tem e-mails pra ela! Vai, é sacanagem! Então vamos lá, pessoal: mais e-mails pra minha véia/ Santinha/ Lelé, também conhecida como Silvia! Heheh. Né, mãe!
                E agora eu já estou um pouco menos com raiva. Já caiu a ficha de que não vai adiantar eu ficar resmungando. O lance é continuar seguindo em frente. Tenho nem o que pensar a respeito, na verdade. Aconteceu e pronto. Já era! Dei um passo pra trás, é fato, e foi inevitável. Agora volto a não saber a data em que vou embora. Praticamente um déjà vu, né! heheh É um saco essa situação, porque fico querendo perguntar ao Rodrigo toda hora quando vou embora. Tipo, ele vem explicar o que está rolando e tal, mas tudo o que ele fala eu ouço meio que através de um filtro, sempre buscando uma idéia de quanto tempo leva a recuperação desses lances, e quando eu vou pra casa. Claro que presto atenção no que ele está falando, mas isso não sai da minha cabeça um segundo, fico pensando: “será que agora é uma boa hora de perguntar?” hehehe. Foda, é praticamente uma paranóia, neurose, sei lá! E só passa quando compro a passagem. Da última vez foi assim, não tem jeito.
                Bom, vou escrever mais um pouco da epopéia. É bom, também, porque levo a cabeça pra outro lugar.
                Eu estava falando da quimio que eu iria começar. Antes de começar esse tratamento, eu tive que colocar o catéter. Na verdade você pode escolher não colocar o catéter e tomar o lance todo na veia. Mas tem risco até de necrosar o braço, de tão suave que são as medicações que compõem a quimio.O problema é que é caro. Pra colocar esse cateter, foi uns cinco mil reais. Chamava-se Porto Cart. "Meu primeiro cateter"! Hahahah. E tinha uma base que era “instalada” embaixo da pele, no lado direito do peito. E antes de cada sessão de quimio, tinha que colocar os fios, tinha uma agulha que furava a pele bem em cima dessa base, era uma agulha meio grossa. O ruim era que, quando não estava rolando quimio, eu só tirava os fios, e ficava sempre com aquela base, meio pontuda, por baixo da pele, o tempo inteiro. Era praticamente uma mini-teta no meu peito! Era muito estranho, e quanto mais magro eu estivesse mais aparecia a mini-teta! Eu fiquei com esse catéter mesmo depois de terminada a quimio, já que havia a possibilidade de eu ter que fazer outra quimio. No fim, fiquei com esse Porto Cart até trocar por esse último catéter que usei, o Hickman. Não sei o que era mais estranho, uma mini-teta, ou um tererê pendurado no peito!
                Comecei a quimio lá pro meio de maio. Meu, vocês não tem noção do tamanho da lista de possíveis efeitos colateriais que eles te dão. Sério, tem umas 3 páginas, fácil! Eu li aquilo e fiquei preocupado, né! Eles podiam resumir a lista com um item, apenas: Pode acontecer TUDO com você, filhão! heheh De verdade. Inclusive, o médico falou que, em alguns casos, eles não dão essa lista ao paciente. Eles fazem uma menor, manualmente. Isso porque alguns pacientes, mais noiados, ao lerem esses sintomas, começam a achar que tem tudo. Meio que projetam em si tudo aquilo que leram. Doido, né! Nesse dia eles já me deram o número do pager do Paulo Hoff, pro caso de uma emergência. E eles descrevem sintomas que configuram situações em que deve-se entram em contato com os médicos imediatamente, assim como os sintomas que são comuns e não oferecem risco, com os quais não se deve preocupar. Enfim,fica tudo bem amarrado, pra evitar qualquer surpresa. A minha quimio seria de segunda-feira a quinta-feira, uma vez por mês.
                No primeiro dia fui com muito medo. Minha mãe até foi e ficou lá comigo. Me assustei quando vi as paradas. Eram três bolsas. Uma com um líquido laranja fosforescente (igual aquele gel de ascender lareira), uma outra bolsa com um líquido preto, e pra terminar uma que era amarelo xixi. Ué, não inventam um monte de cor, sei lá, tipo roxo beterraba, vermelho tomate, azul calcinha? Então, esse era amarelo xixi! Eu ficava umas 3 a 4 horas no hospital, na salinha da área de químio. Sempre pedia sala com cama, porque aí eu capotava. E terminado o primeiro dia eu estava bem. Segundo dia, também. Mas sempre pensando que uma hora ia rolar a house desabation e eu ia ficar podrão! Por fim, fiz os outros dias e beleza. Não rolou enjôo, nada. Nenhum dos 4568942 possíveis sintomas. E minha mãe nem ia mais, meu pai me deixava lá, ia pro escritório e depois passava pra me pegar. Eu iria sozinho, mas não pode, é uma regra do hospital. E eu chegava em casa na hora do almoço com uma fome absurda! Isso era por causa da cortisona, que realmente dá fome, a pessoa retém mais líquido, fica com aparencia inchada. É um problema ainda maior pra paciente gordinho. Mas continuei a achar que logo iria dar alguma coisa. Ficava toda hora puxando meu cabelo, pra ver se estava firme. Os médicos haviam me dito que, se eu fosse ficar carecão (pois era uma possibilidade, não certeza), o cabelo cairia a partir do segundo ciclo da quimio.  Lembro que, antes de começar o segundo ciclo, eu tirei a costeleta. A idéia é que assim seria menos impactante, aos poucos. Melhor do que ficar sem todos os pelos de uma hora pra outra, né! Depois de um mês, eu voltei para o segundo ciclo. A essas alturas tinha tido alguns sintomas, que foram na verdade apenas dois, que eu me lembre. Muitos cravos, no corpo inteiro, e que coçava demais. E muitas aftas na boca. Eram umas quinze ao mesmo tempo. Era surreal aquilo. Era muito ruim pra comer. Eu quase não mastigava, dava duas mordida e engolia! Eu andava até com pasta de dente na mochila. Escovava antes, pra conseguir comer, e assim que terminasse. Mas o cabelo continuava ali.
                Fiz o segundo ciclo e continuei apenas com esses sintomas. Só que uns 10 dias depois, eu estava em casa com a Jack, era fim de tarde, quando olhei o meu travesseiro e ele estava preto! Sério, estava tomado por muito cabelo. A gente ficou assustado! A Jack foi testar e puxou um pouco de cabelo da minha nuca. Veio um tufo de cabelo... O que ela puxou, veio na mão dela, sem ela fazer força. E eu não senti nada, não senti um puxão. Essa hora eu gelei. Peguei e puxei os pelos do cavanhaque e veio na minha mão. Ou seja, o cabelo estava morto, não tinha mais raízes. Eu fiquei ainda um tempinho meio abobado, mas a Jack me agitou e fomos procurar um lugar pra eu raspar o cabelo. Mas já eram 19h, horário em que a maioria dos cabelereiros fecha. Eu entrava afobado nos salões e falava: “ eu preciso passar a máquina, você faz isso pra mim, é rapidinho.” Eheheh. Levei alguns nãos, até que uma japa aceitou. Acabei decidindo pela máquina 3, em vez de raspar zero. Pelo mesmo motivo que tirei aos poucos a barba. Seria menos impactante. Eu queria passar um final de semana com aquele cabelo. Seria mais fácil pra me acostumar. Durante esses dias, eu tinha o maior cuidade no banho, porque era só encostar no cabelo pra ele cair. Mas chegou no domingo e não dava mais, eu tinha que raspar zero. Estava com uns buracos gigantes no meu "penteado." Parecia bicho de faculdade depos do primeiro dia de trote! Então fui com a Jack no único que tinha aberto, perto da casa dela. Mas mesmo raspando com máquina zero, ficaram muitas falhas. Mas eu estava resistente a raspar com gilete, e fui embora. Mas no caminho a Jack me convenceu e voltamos lá pra finalizar, de vez. E a infeliz da cabelereira quase arruma briga com a Jack, que ficou puta com o comentário: “hmmm mas não sei se você vai ficar bem se raspar com gilete. Já perguntou se ela vai gostar?” E apontou pra Jack. Heheh. A Jack quase falou: “não, ele vai raspar porque o cabelo está caindo por causa da quimio que ele está fazendo, mesmo!” heheh. Mas eu, nessas horas de stress, sempre preferi ficar quieto, assim a situação acaba mais rápido. Aí a mulher raspou com aquelas laminas de barbear das antigas. Nossa, aí foi uma sensação muito bizarra. Eu não conseguia parar de por a mão na cabeça. Era muito estranha, parecia que era a cabeça de outra pessoa. E eu sempre tive essa puta juba, né! Ainda bem que, dias antes, eu e a Jack tínhamos ido ao centro fazer um estoque de bonés, gorros e boinas! E isso foi no começo de inverno, lá pra Junho, mais ou menos. E, nas primeiras semanas, até pra dormir eu colocava um gorro! Sério, dava o maior frio no Côco. E meu, a minha careca não era, exatamente, a mais bonita. Eu tenho um galo, desde criança, bem no topo da cabeça! Nossa, parecia aqueles Coneheads, sabe? Tinha um seriado de uns caras com a cabeça em forma de cone! Era igualzinho a mim! Inclusive, foi prevendo toda a beleza que surgiria com a revelação da minha careca, que eu pedi um tempo pro Paulo Hoff pra ganhar mais peso!
                Bom, pra variar escrevi demais! Agora vou dormir. Um beijo pra todo mundo e, mais uma vez, obrigado pela força! Saibam que nunca vou esquecer. Nem minha véia!

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Faaala!
                Então, hoje as notícias são bem ruins. Eu estava com muito medo de isso acontecer. Bom, pra não fazer terrorismo com o assunto, vou começar pelo final: Não poderei mais voltar no sábado, dia 26. É, isso mesmo! Puta que o pariu! Ficamos sabendo disso na 2ª. feira a noite. Foi um direto na cara essa notícia. Não me lembro de ter ficado tão triste assim aqui, em nenhum outro dia. E o baque foi grande porque eu estava muito empolgado, feliz pra caramba, vendo os comentários e mensagens de todo mundo e tal. E aí, na última consulta com o Rodrigo, vem essa bomba.
                O que rolou foi o seguinte. Eu estava com aquela febre chata já havia uns dias. Tinha dor de cabeça e dor no lugar onde estava a borseta. Mas não me preocupei, pois os médicos sempre disseram que febre, pra ser preocupação no caso de um transplantado (rejeição), tem que ser de 38,5 C pra cima. E a minha não estava chegando a isso. E eu havia feito exame de sangue e urina na sexta, que não acusaram nada. Mas, no domingo, a febre chegou a 39 C. E na segunda-feira tínhamos a tão esperada última consulta com o Rodrigo. Ele ficou preocupado e pediu uma tomografia. Fiz o exame no mesmo dia, depois de tomar aquele contraste, que, quem já tomou, sabe como é gostoso (o daqui é misturado com Gatorade). E o Rodrigo falou que eu deveria esperar em casa, pois eles ligariam em caso de ter algo de errado. Fui pra casa torcendo pra o telefone não tocar! Almocei e capotei. A febre e a dor de cabeça estavam enchendo o saco esse dia, estava foda. Inclusive, foi a primeira vez que não consegui comer tudo em muitos tempo!
                Pouco depois de deitar, sou acordado pela minha mãe: “É do hospital, pra você!”. Aí eu já pensei né: “fudeu!”. Era a coordenadora de transplantes. E ela não sabia de nada. Disse que o Rodrigo tinha ligado pra ela e que era pra eu ir pro hospital tomar um anti-coagulante. “Porque?”, eu perguntei. E ela “o Dr. Rodrigo não me falou, disse apenas pra você ir porque ele não gostou do que viu no exame. E você vai ser internado!”. Ô beleza né. Disse que me ligariam quando fosse pra irmos ao hospital, pois ainda não tinham achado um quarto vago. Esperamos um pouco. Eu, dormindo, e minha mãe, do jeito dela, desesperada. E eles não ligavam nunca, aí nós fomos. Minha mãe teria um troço se esperássemos mais. E nesse meio tempo percebemos que não temos o celular particular do Rodrigo, só o do hospital, que ele não atende. Mas mandamos ver nos e-mails. Chegando ao hospital, já tinham um quarto pra mim e tal. Acho que a coordenadora que fez confusão, pois estavam esperando a gente faz tempo, enquanto nós esperávamos pela ligação deles.
                E, no quarto, vi o e-mail com resposta do Rodrigo sobre o que aconteceu. Primeiro, ele achou um abscesso bem embaixo da cicatriz de onde estava a borseta. Pra quem não sabe, abscesso é um ponto infeccionado, um acúmulo de pus. Ele estava desconfiado dessa possibilidade. O tratamento é pôr um dreno no local. Eu coloquei hoje cedo. Mas é sussa, anestesia geral e já era. E quando colocaram o dreno, já coletaram um pouco do pus pra fazer uma cultura. Assim, descobre-se qual é o vírus e já vê qual o antibiótico exato pra tratá-lo. Aí é só tomar essa porra, e boa! O que ele não esperava achar nesse exame é um coágulo na veia principal que leva sangue ao fígado. Isso pode vir a ser perigoso, caso não se descobrisse. Pode, naturalmente, entupir a veia e o fígado vir a falecer. . Mas não no meu caso. Viram num estágio inicial da parada e já mandaram anticoagulante na minha veia, na segunda-feira a noite, mesmo. Inclusive, hoje já não vai ser mais na veia, vai ser um comprimido, mais sussa.
                E é isso. Mas eu ainda não falei com ele pessoalmente. Ele disse que ainda bem que descobrimos isso antes de eu voltar e tal. Com certeza, se eu estivesse no Brasil ia ser um auê da porra! Por mais que desse tudo certo no final, ia dar um medo, sei lá, meu médico é o Rodrigo e eu iria estar um oceano longe dele! Mas o melhor mesmo era não ter acontecido nada e eu estar pronto pra voltar pro Braza, né!!!! Nossa, quando eu soube que teria que adiar a passagem, me deu uma tristeza muito forte. Quando falei pra Jack, então, vixi. E vendo todo mundo escrever aqui no blog e tal, sobre como estão feliz por eu estar voltando sábado! Muito complicado, não tenho nem palavras pra explicar como estou me sentindo, de verdade! Não tinha coragem nem pra escrever aqui que cancelei a volta, depois de ter escrito todo empolgado que voltaria no dia 26 (aniversário da minha prima-irmã Ana Rosa!!!!!) e tal. É muita tristeza, misturada com decepção, impaciência, ansiedade. Deu até um pouco de desespero por essa impotência em relação a essas coisas. Me senti vendido na história! E todo mundo tem um limite, né. O meu estourou, passei dele dessa vez. E foi com pé na porta.  E agora eu não sei quando vou poder voltar, já que não consegui falar com ele. E provavelmente ele não terá uma data já amanhã, vai querer ver como meu corpo reage e tal . O que é certo, né! Infelizmente, nunca, ou quase nunca, é errado esperar, quando falamos do nosso corpo! Digo esperar monitorizado, remediado, com acompanhamento e etc. Mas é o que mais me deixa na nóia, esperar! Não agüento mais! Eu também cansei de, pra me animar, pensar em tudo que eu já passei, e que agora falta pouco. E que perto do que eu já vivi isso aqui é tranquilo. Eu sei, mas não adianta. Agora eu quero mais! Cansei de ficar só olhando pela janelinha tudo o que eu poderei viver, ficar imaginando, sonhando e tal. Não dá mais pra ficar vislumbrando esses dias, e pensar que logo mais estarei os vivendo. De verdade, antes que digam, não faz diferença nenhuma pra mim se eu volto daqui a pouquinho, ou se estivéssemos em Dezembro ainda, com meses pela frente. Não que não faça diferença mesmo, mas, no fundo, situação é a mesma: eu estou aqui, e não aí! Simples. Já falei isso, eu não sou muito bom em ficar feliz hoje pelo que vai acontecer amanhã! E eu não consigo estar feliz por estar quase no Brasil. E não sei ser quase feliz! “Quase” é igual “se”, não existe. Sei lá, talvez seja meio nada a ver o que eu estou dizendo, mas é por aí, é meio isso que eu sinto e gera toda essa ansiedade e que, na segunda-feira, me fez chorar como criança. Cansei, acabou de vez minha energia, de verdade. Estou no “quase” desde o fim do ano passado. E não vejo a hora de sair do quase e entrar no avião!
                É isso aí, vou dormir porque aqui no hospital é aquela rotina gostosa. Tem tanta coisa legal pra fazer, que eu fico cansado só de pensar, tentando escolher a maior diversão. Aí depois me atrapalho com tantas coisas gostosas que tem na cozinha daqui, ansioso pela hora de comer. Aí acabo dormindo quase o dia todo. É, estou, sim, meio mal humorado mesmo hoje. Por isso que não escrevi nem ontem nem anteontem... estava pior ainda! Mas logo volto a ser o melhor anedotista pós Costinha!
                Um beijo pra todo mundo e é nóis! Não desistam de mim, não, que uma hora eu volto. E levo a Santinha!

domingo, 20 de fevereiro de 2011

EPOPÉIA 13

Ooooopa!
                Então, hoje fomos no hospital pra ver uma febre e dor de cabeça que estão me enchendo o saco há uns dias. Mais porque minha mãe insistiu. Mandei um e-mail pro Rodrigo ontem e ele falou pra irmos hoje cedo ao hospital pra dar uma olhada. Aí chegando lá fiz uns exames de sangue e viemos embora. Mas eles acham que não é nada demais. É normal eu ter febre de vez em quando. É a reação do meu organismo se entendendo com os órgãos novos. Já aconteceu outras vezes. E o que rola é que fazem um monte de exames, sempre, e nunca acham nenhum motivo. Mas eu fui lá mais pra minha mãe ficar tranqüila. Segunda-feira voltamos lá pra conversar com o Rodrigo e eles devem ter o resultado dos exames. Tranquilo, não deve ser nada demais. E essa febre não me incomoda, o chato é a dor de cabeça, essa realmente enche o saco.
                Vou continuar a epopéia. Depois que eu fui diminuindo a morfina, o intestino começou a se entender melhor. Aos poucos foram liberando as comidas, até chegar a bifes e tal. Mas era muito ruim a comida. Muito ruim demais, então minha mãe trazia um rango de casa pra mim. Foi aí que eu passei a ter moral nas decisões gastronômicas lá de casa! Heheh Ela fazia qualquer coisa que eu pedisse, tadinha! E o chato dessa vez foi que meu paladar estava todo zuado, eu estranhava todas as comidas, quase. Mas até que não demorou pra eu voltar a comer normalmente. Foi a vez mais tranquila nesse sentido. Claro né, nessa época meu intestino estava inteiro ainda. Eu tinha todos os órgãos, de fábrica! Bom, aí me deram alta. Fui embora num sábado de muito sol. E esse caminho, do hospital pra casa me marcou muito, nunca esqueço. Foram o meu pai e o Du me buscar. E nesse tempo que eu fiquei internado, em nenhum dos quartos tinha uma janela que fosse pro céu. Era sempre grudada em outro muro. Então, quando eu estava indo pra casa, eu nem acreditava que estava vendo um céu azul. Acho que, mesmo se estivesse chovendo, já ia estar valendo! Então foi meio emocionante esse caminho pra casa, pra mim. Lembro direitinho dessa “carona”. Toda vez que eu tive alta, sempre foi uma sensação ótima. Mas aquela vez foi mais forte. Acho que por ser a primeira, e a primeira vez a gente nunca esquece né! heheh Mas sério, acho que depois eu fui até acostumando a ser internado e ter alta, aí não era mais esse lance todo quando eu tinha alta. Eu ficava feliz em sair do hospital, e só. Nada demais.
Eu lembro que tinha muita vontade de comer num japa, né! Mas era muita. Aí, assim que eu saí do hospital, no dia seguinte, eu acho, fomos num restaurante japonês perto de casa, o Kampai. Meu, lembro que não conseguia andar direito depois, de tanto que comi. Nossa, comi quase o mesmo tanto que costumava a comer. Barbarizei! Depois não conseguia nem esticar a barriga heheh. Mas foi bom! Eu sonhava com isso! Lembro que na época que eu estava sem poder ingerir nada, o que eu mais queria era água. Depois vinha uma coca com bastante gelo, depois um suco de laranja, também com gelo, e depois um japa!
Bom, depois da alta, começou então o tratamento. Eu tive ainda uns contatos com o Amsterdãm e o Dr. Arthur Ricca, mas foi só pra tirar os pontos da cicatriz da cirurgia e uma ou outra vez pra conferir se estava bem cicatrizada. O Amsterdãm eu nunca mais quis ver, depois que fiquei sabendo das paradas, e o Dr. Ricca foi mais natural. Ele simplesmente não era a pessoa para o meu caso. Ele mesmo tinha consciência disso. Pouco antes de eu ter alta, meu pai já havia se encontrado com o Dr. Paulo Hoff, e decidido que ele seria o “cabeça” do meu tratamento. Acho que eu já devo ter falado aqui, mas como agora estou contando a epopéia, acho legal apresentá-lo. O Paulo Hoff é oncologista do Sírio Libanês. Ele é considerado o melhor do Brasil, tratou, por exemplo, da Dilma Rousseff quando ela teve câncer, e é responsável pelo tratamento dos milhões de tumores que tem, e teve, o José Alencar. Aliás, várias vezes, em minhas internações, eu acordava com o barulho do helicóptero dessa galera chegando lá. Se você for ver, era sacanagem, só pra eles não serem incomodados, eles acordavam o hospital inteiro! Povo folgado, pô!
Uns quinze dias depois que eu saí do São Luiz, eu fui ao Sírio, conhecer o Paulo Hoff e ver o que ele tinha em mente. Mas, só pra constar, aquela não foi a primeira vez que fui ao Sírio. Eu tinha operado de apendicite lá, quando tinha 13 anos. Foi a primeira cicatriz da minha barriga! heheh E o Paulo Hoff falou que o caso era raro, não havia literatura médica a respeito, e que ele faria um tratamento testando diversos caminhos, até ver algum que funcionasse. Fiz também um monte de exames. Nesse dia o que ele recomendou foi apenas uma alta dose, 800mg, de Celebra, que é um antiinflamatório. Poderia funcionar. E ajudaria também a controlar um pouco os pólipos. Esse Celebra eu tomei durante todo o tempo, até tirar o intestino. Era sempre alguma coisa mais o Celebra. Ele cogitou a possibilidade de quimio, mas eu meio que fingi que não era comigo, não queria nem pensar nisso! Mas, depois de uma semana ou dez dias, tivemos uma nova consulta. E então ele falou que, na reunião com os colegas eles tinham concluído que a melhor alternativa era tentar uma quimio. E essas reuniões de “colegas” rolavam a cada uma ou duas semanas, eu acho. Era entre os médicos do Sirio, de várias especialidades, e eles levavam os casos mais complicados. Claro que o meu sempre estava entre os assuntos mais interessantes a serem discutidos, né! Mas quando ele me falou da quimio eu fiquei bem triste. E pedi a ele também pra me dar um tempo maior pra eu me recuperar, ganhar um pouco mais de peso e tal. E eu estava engordando rápido. Na verdade foi porque eu  fiquei com muito medo. Chegando em casa fiz uma lista gigante de perguntas. Ele mesmo aconselhou que eu fizesse.
Chorei bastante esse dia. Lembro de chorar ao telefone contando pra Jack. Pra mim era realmente uma tragédia ter que fazer essa quimio. Porque, além de ser um sinal que meu lance era grave pra precisar disso, pra mim, quimio era literalmente um bicho de sete-cabeças, ainda. Ficava me imaginando careca, sem sobrancelha... Pensava no mal-estar que rolaria, nos enjôos...  Enfim, era como se a quimio fosse uma nova doença por si só, pelo tanto de efeitos colaterais que provoca. Aliás, isso é um assunto interessante, pra um outro momento. Porque, realmente, muitos médicos hoje vêem esse tratamento como gerador de outros problemas, as vezes tão grandes quanto os que procura-se combater com a quimio. Talvez esteja na hora, ou já passou da hora, de evoluírem com a quimio pra que ela atinja somente as células do tumor, e não que entre no sangue e “abrace” todo o corpo. Pode até gerar outros tumores. Isso é verdade, mesmo. Algumas, ou muitas vezes, o lado prejudicial desse tratamento pode se equivaler a sua eficácia no que se propõe a fazer, o que põe em dúvida a sua aplicação em muitos casos, e questiona também essa devoção a quimioterapia que os oncologistas parecem ter. Ou mudem a forma de agir da quimio, ou encontrem alternativas a ela, não é? A tecnologia está aí, tudo é possível, acho que é mais uma questão de direcionamento das pesquisas.
Ih, escrevi demais, de novo! Vou dormir agora, amanhã eu continuo aqui!
Um beijo pra todo mundo! Saudade de vocês!

sábado, 19 de fevereiro de 2011

EPOPÉIA 12

Faaaala!
                Por enquanto não tem novidade. Só ansiedade! Se bem que ontem foi engraçado. Fomos ao cinema, e assistimos o Toy Story 3 em 3D. E minha véia nunca tinha ido em cinema 3D. Meu, vocês não tem noção! Começou e filme e ela: “ai Renato, que que é iiiiisso meu filho! Nossa senhora, miiiiinha mãe! Ai to com medo, vou tirar esse óculos!!”heheh Tive que falar que estava tudo bem, acalmá-la, senão era capaz de ela tirar mesmo! Mas foi muito engraçado! E só tinha a gente no cinema. Sério, uma puta sala Imax gigante, com umas 600 poltronas, e só a gente! Ainda bem, porque nessa hora minha mãe falou um pouquinho alto, viu! E eu, mané, chego em casa e percebo que esqueci minha mochila. E o pico já tinha fechado! Maior nóia, porque tinha minha carteira né, e perder a carteira é um saco.  Mas deu tudo certo, hoje cedo liguei lá, eles acharam minha mochila e depois eu fui buscá-la a tarde. Tranquilo.
                Como não tenho mais muito assunto, vou falar da epopéia! É o seguinte: Depois que eles me visitaram aquela primeira vez, passaram a me visitar todos os dias, em todos os horários, iam revezando. O resto do tempo eu ficava vendo TV. Mas mesmo “acordado”, eu ainda rodava o hospital inteiro. Ficava um dia em cada cômodo. Sendo que era viagem minha, eu nunca saí da cama enquanto estive na UTI. Mas aos poucos eu ia voltando... para o meu nível natural de leseira! E quando soube da história do que tinha acontecido, que eu não viajei o Brasil inteiro (eu não lembro direito, mas eu fui pra Boston também, sei lá como, mas lembro disso), eu fiquei muito confuso. Fui percebendo que não lembrava de nada quase, muito do que tinha acontecido antes do coma, eu não tinha idéia. Umas coisas eu ia lembrando conforme me contavam. Muitas visitas eu não lembrava. E em cada visita que me faziam, quase sempre eu queria saber sobre esses dias, o que eu tinha feito. Eu fiquei bem impressionado com algumas coisas e tal. E, no começo, não me contaram tudo de verdade, tipo, toda a gravidade do que havia acontecido. Por exemplo, não me falaram que o Dr. Amsterdãm tinha feito tantas coisas legais durante o tratamento. Mas isso eu entendi, porque ele iria continuar me atendendo no hospital, então era importante eu não ter bode dele, pro meu bem. E eu até gostava dele, não sei porque. É que quando ele viu que eu não empacotei, ficou todo e todo com a gente, querendo compensar. Era o mais simpático do mundo, mais solícito. Claro né, ia fazer o que depois de tudo? Só quando saí do hospital que soube o que rolou, porque mesmo a parte em que eu estava bem, as cagadas que presenciei antes do coma, eu havia esquecido.
                E por um tempo eu achei também que tinha tirado boa parte do tumor. Não tirou nada. E falavam também que depois que eu saísse, o tratamento seria simples, eu tomaria Celebra por um tempo, o tumor regrediria e já era. Acho que era o que minha família queria acreditar. E eu também, né. E, sei lá, eu fiquei com uma sensação de que o pior tinha passado, que eu tinha vencido, não tinha morrido e tal. Com certeza, eu não fazia idéia do que iria acontecer. Aliás, o Daniel não me falou, nessa época, que a médica Japinha falou que eu ia morrer, assim sem firulas. Me falavam que eles davam 30% de chances e tal. O que eu já achava barbárie! Acho que também não queriam que eu tivesse energia ruim em mim, em relação a nada ou ninguém. Concordo com eles, energia ruim não ajuda. Quando eu tive alta da UTI, era o Israel que estava comigo no quarto. Legal, né! Chorei muito ao chegar no quarto da semi-intensiva. Nossa, ali era o paraíso pra mim. Sentia como se tivesse saído do hospital! Pra vocês terem uma idéia como é ruim uma UTI. Perto dela até uma semi-intensiva é legal!
                E fiquei muito feliz que tinha telefone e eu podia usar. Na UTI não podia celular, nem nada. Eu tinha muita vontade de falar com meus amigos, pois durante o tempo todo lá eu só falava com minha família e a Jack. Claro que eram os mais importantes, mas eu me sentia isolado do mundo. E na hora eu peguei o telefone e liguei pro João, pro Luciano e pro Pimenta. Lembro que o João estava saindo de um jogo do Corinthians, com o Nonô e o Buzudo, acho. Nossa, eu tinha que desligar logo, pois não queria dar uma de chorão. E era começar a falar que eu começava a chorar. Aliás, essa internação foi minha fase mais chorão. Sei lá o que dava, eu chorava toda hora, as vezes do nada, vendo TV sozinho, muito doido! Mas é bom chorar, né! É que eu nunca fui muito de chorar. Eu devia chorar mais, eu acho, mas é bem raro. Tem vezes que quero, mas não consigo.
                E na semi-intensiva eu comecei a receber visitas. Era muito legal, me fazia muito bem. Foi uma galera. Mas depois de uns dias, acho que uma semana, eu comecei a ficar meio cansado, não só fisicamente, da cabeça também, e passei a não querer mais visitas. Era um lance que eu me sentia muito mal em fazer, lembro que teve gente que chegou até a porta e eu não quis falar. Acho que foram dias em que o côco aqui ficou meio atrapalhado. Afinal, eu comecei a saber e entender tudo só depois, quando estava na UTI e mais quando estava na semi. Era muita informação. Mas eu recebia gente ainda. Mas não tinha nada a ver com quem ia, eu simplesmente tinha dias que não queria falar com ninguém. Até a Jack, por exemplo, que ia todo dia me ver, tinha dias que ela levava um livro e ficava lá do meu lado, quieta, a gente nem trocava uma palavra. Ela foi esperta, quando percebeu essas minhas variações de humor, deixava sempre um livro na bolsa! Lembro que quando isso acontecia, eu nem tentava entender e ir contra. Eu meio que aceitava e deixava ser. Estava começando a tentar me entender e me respeitar. Porque um lance que atrapalha a gente a ser o que temos que ser é essa mania de que tudo tem que fazer sentido, né. Mas é um sentido que vem de fora, uma convenção, algo não tão seu. É baseado em alguma lembrança, coisa passada, algo que você viu, ou até mesmo aconteceu com você, mas em outro momento. A gente sente alguma coisa, que vem de dentro, mas aí pensa: “ah, nada a ver, eu estou viajando!” E desencana. É assim que a gente vai ficando mais longe de nós mesmos! Temos que nos respeitar mais. Às vezes, acho que, se a gente pensasse menos, em certos momentos seria melhor. Ih é um papo longo... mas por cima, é isso... eu acho!
                Acho que fiquei uns 25 dias na semi-intensiva. O tempo lá foi chato. A empolgação, o paraíso, não durou muito, não! Heheh Depois de uns dias eu comecei a tomar água e sucos (aqueles de caixinha). Depois fui pra gelatina. Depois tinham aquelas sopas horríveis. A comida do São Luis é pior do que a do Sírio. Mas lembro que quando passou pra sopinhas, aí o intestino voltou a ativa. Nossa, vocês não tem noção. A primeira noite foi barbárie! E eu tinha que chamar a enfermeira toda hora, pois não andava, tinha que ir de cadeira de rodas pro banheiro. Confesso que umas vezes não dava pra esperar. Sim, eu usei fraldas geriátricas um tempo! E mesmo assim, umas vezes tinha que trocar a roupa de cama toda. Nossa, agora me veio direitinho essas cenas da fralda... Com certeza foi o momento mais constrangedor desses três anos! E não era uma vez ou outra. Acho que nessa primeira noite, “o intestino funcionou” (de nada!) umas trinta vezes. De verdade, chutando baixo. Era impressionante, meu intestino estava como um tobogã! As paradas que eu comia não davam nem oi. Passavam direto, sem olhar pro lado! Lembro que fiquei noiado, porque a Jack iria dormir comigo no dia seguinte, lá. Aí é foda né. Porque uma coisa é isso acontecer com o Dudu ali. Estou nem aí, problema é dele! Heheh Mas com a namorada num rola! Ainda bem que, no dia seguinte, me deram alguma coisa, e o intestino também começou a ficar mais calmo, e a noite foi mais tranqüila. Digamos que não chegou a ser romântica, mas não foi o desastre que poderia ter sido! Ah, e nesse dia me falaram que a morfina atrapalhava o intestino. Eu tinha aquela bombinha de PCA com morfina, né. Meu, na hora, parei de tomar. Sentia umas dores fortes nas costas, mas preferia as dores do que as 30 vezes daquela noite. Sério, foi traumatizante! E graças a Deus que isso nunca mais se repetiu! Inclusive, pensando agora no desenrolar da epopéia, eu vim a ficar um ano sem mandar um #2, né! Olha, será que foi pra compensar a diversão daquela noite? Heheh
                Bom, depois eu continuo! Ah, e uma notícia boa, que eu estava esperando faz tempo! Compramos as passagens de volta!!! É isso aí, dia 27, sem ser esse domingo, o outro, estamos chegando! Agora é oficial! É meu, agora acabou a folga de vocês, eu e minha véia vamos chegar chegando aí, viu! Daqui uma semaninha é nóis! Não, quase não estou ansioso, quê isso! Vai Curintia! E sacanagem, meu amigo Ronaldo se aposentou! Depois eu conto o dia em que batemos o maior papo na sala de tomografia do Sírio! É, meu, depois de ouvir o que tinha rolado, ele lançou um "caraaaaca mermão!". Pois é, o Fenômeno ficou impressionado! Viu só, não sou pouca bosta não, meu, eu sou é muita bosta, meu amigo! heheheh
                Beijão pra vocês e até mais!!

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Faaaaala!
                Então, hoje foi um dia chato. Bem chato. Na verdade, ontem e hoje (segunda e terça-feira). Mas com notícias boas! Foi o seguinte: Nós fomos pra consulta com o Rodrigo e exames de sangue, ontem pela manhã. Não tão manhã, na verdade. É que, assim, quando saímos do hospital (em outubro ainda, na alta pós transplante), eles vieram falar sobre quando teríamos que voltar ao hospital. Deram a data e tal, e disseram que tínhamos que estar lá as 7h30 da matina. E nós acordamos então as 6h pra pegar a van das 7h. Chegamos, fizemos o exame de sangue e esperamos muito. Até umas quase 10h. E, meu, a poltroninha da sala de espera não é muito boa. Principalmente pra quem tem mais de um metro e meio de altura! E eu sou magrelo mas sou alto, né. Bom, aí vimos que não havia necessidade de chegar tão cedo! Na consulta seguinte, pegamos a van das 8h. Vimos que ainda assim, era cedo. E foi indo, até que ontem pegamos a van das 10h, mesmo! heheh. Ah, é bem melhor. Você chega, vai logo tirar sangue, senta um pouquinho, vai tirar os sinais vitais e, depois de 10 minutos, já é atendido! A única coisa é que os exames não ficam prontos a tempo. Mas sussa, se tiver algo eles ligam ou mandam e-mail. E é sempre o nível de Prograf no sangue , que tem que diminuir ou aumentar a dose. Ou seja, é tranquilo. Pra que acordar tão cedo, se posso dormir mais um pouquinho? E nesse frio, ainda... tá doido! Se bem que aumentou a temperatura esses dias. Está acima de zero grau, até. Finalmente!
                Mas então, aí chegamos na consulta, o Rodrigo olhou e tal e falou que está tudo certo. Disse que podemos comprar as passagem pro fim do mês! E inclusive, falou que estava difícil conseguir uma data pra colostomia, que é um exame que eu teria que fazer antes de voltar. Pra não ter problemas e atrasar a volta, ele sugeriu que eu me internasse, pois para pacientes internados é mais rápido, interna em um dia e já faz o exame no outro. Então eu já fiquei no hospital, ontem mesmo. Foi então que começou a chatice. As 18h vieram falar que eu não poderia comer mais nada. As 20h comecei a tomar aquela parada nojenta pra fazer o intestino funcionar – notem a forma polida encontrada para descrever essa situação tão gloriosa. Lá pras 22h o lance começou a fazer efeito. Aí já era. No começo  – as duas primeiras horas -  você vai ao banheiro de dez em dez minutos. Depois a brincadeira fica mais calma... a cada meia hora, vai. Mas é a noite inteira. Você não dorme. E eu estava tomando soro, então tinha que, toda hora, arrastar aquele tripé! Mas, finalmente, as 8h vieram me buscar pro exame. Aí é rapidinho, eles te dão anestesia e você logo capota. E dessa vez a anestesista pôs devagar o remédio. Foi até divertido... mas nada que durasse mais do que uns 30 segundos. Aí, quando você vai ver, já está na sala de recuperação.
                E acaba com o dia. Eu só queria dormir, o dia inteiro. Você fica meio lesado, e junta isso com o sono acumulado. Nossa, é complicado, eu só levantava da cama pra ir no banheiro. É, você ainda tem reflexos durante o dia inteiro. Ficou uma zona aqui dentro. Acho que só agora acalmou um pouco. Chegamos em casa por volta das 20h. Mas pelo menos estou livre desse exame, que é o mais chato do mundo! É muito chato. E pra mim é pior, já que estou nessas de ter que engordar e tal, e nisso de ficar reinando no banheiro, é claro que você emagrece, né! Ao menos, agora, eu só tenho que fazer colonoscopia de novo daqui a seis meses! E a parte melhor de ter feito é que agora o caminho pra volta está livre!
                Eu vou aproveitar pra mandar umas fotos que eu achei no meu celular, de datas variadas e tal. Lá vai:
Essa é uma foto de saudades. Os três e a mesa da nossa ceia de Natal!


Esse é um dos melhores reataurantes que a gente foi aqui. Chama Cheesecake Factory, mas não é só de doces, não. Claro que eles tem mil tipos de cheesecake como sobremesa... Mas animal, rango muito bom!

Essa eu tirei pra vocês terem uma idéia de como é a brincadeira! heheh Mas até que já me acostumei!
Ah essa eu tirei do livrinho que me deram quando fui internado pro transplante. Achei engraçado o esquema deles pra te ajudar a descrever a dor! heheheh



segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

EPOPÉIA 11

Ooooba!
                Tudo bem por aí? Aqui tudo certo. Amanhã tenho consulta e exames no hospital. Vamos ver se temos boas novidades. Eu acho que não vou ter engordado, não. Estou comendo pra caramba, de verdade. O lance é que a absorção ainda não está total. Então fica meio complicado. Vou ver se ele acha melhor eu aumentar a dose de remédio que ajuda na retenção dos líquidos. Não vejo outra coisa a ser feita. Porque eu não estou comendo coisas gordurosas demais e tal. Não estou tomando leite, que eu gosto pra caramba! Ou seja, estou comendo coisas leves, que deveriam ser melhor absorvidas. Acho que a única coisa a se fazer é aumentar a dose do remédio, mesmo. Vai ser assim até o meu intestino dar conta do serviço. E, se for ver, ele está trabalhando em período integral há pouco tempo, né! rs. Porque, depois que eu melhorei da rejeição e, principalmente, quando tirei o tubo e a borseta, é que comecei a comer normalmente. Então faz muito pouco tempo. E acho que estou no caminho.
Então é isso, amanhã vou lá pra definir de vez minha volta. É esse meu pensamento. Não tem mais o que fazer aqui, eu acho. Acabou o tratamento! E eu não falo isso querendo impor essa idéia. Nem a mim, nem a ninguém. Até porque não existe isso. Falo é com convicção, mesmo. Acredito nisso, de verdade. E meu aniversário está chegando, né! Já passei o Reveillon e o Natal aqui, passar o anversário de 30 anos, não... aí é sacanagem! E outra, eu sinto saudade de todo mundo, demais mesmo. Mas saudade da Jack é o que mais pega! Meu, você já passou seis meses longe da sua namorada? É meu amigo, é complicado... É como se estivesse sempre faltando alguma coisa... sei lá... é bem ruim, viu!
E agora, só pra terminar de vez o lance dos sonhos. Na verdade tem mais coisa na minha cabeça. Mas eu não consigo organizar essas memórias a ponto de torná-las compreensíveis. Eu tenho imagens na cabeça, uns flashes sem nexo nenhum com nada. Mas só pra concluir. Lembro do dia que um enfermeiro chegou pra mim e disse que tinha conseguido falar, por telefone, com minha família e eles estavam vindo me ver. Isso deve ter sido logo que eu acordei do coma. Mas na minha cabeça eu não tinha acordado só naquele dia. E eu pensei: “nossa, como eles souberam que eu estava aqui”. Achando que o enfermeiro tinha ido atrás da minha família, eu até agradeci o cara por ter avisado a eles! rs. E com certeza ele não disse isso, que falou por telefone! Foi viagem minha. E fiquei com o maior peso na consciência, pensando: “puts, eles tiveram que voltar da Austrália, por minha causa. Voltaram só porque eu me meti nesse rolo todo de ser atropelado. Vacilei, estraguei a viagem da galera!” E aí, não tenho muita noção de tempo, se foi no mesmo dia, veio me visitar a minha mãe, meu pai e o Dudu. Era só três por vez na UTI, né. Na verdade, o que estava rolando era a primeira visita deles depois que eu acordei do coma. E a primeira coisa que lembro é o Dú, pegando com força a minha mão e falando: “Tamo junto, Rê, tamo junto!”. E meio chorando. E eu não sabia porque ele estava chorando. Afinal, ele nem sabia o que tinha acontecido comigo! Ninguém sabia, já que eu não tinha contado pra ninguém minhas aventuras pelo Brasil! O meu pai falou, também choroso, que a Jack viria me visitar no próximo horário. E eu pensei: “Nossa, ela continua comigo, mesmo depois de eu ter sumido esse tempo todo!” heheh.
Aí eles foram embora. Eu ainda não conseguia falar. Pensei que era melhor recuperar a voz, pra então contar a todos o que tinha acontecido nesses dias em que eu havia sumido. Porque minha voz estava muito fraca, não saía direito. E no outro horário veio a Jack, o Daniel e minha mãe. E não sei o que me deu, mas essa hora eu queria ficar sozinho, não queria ninguém no quarto comigo. E primeiro minha mãe entrou no quarto, mas eu não tive coragem de falar pra ela ir embora. Pedi então pra chamar a Jack. E comecei a falar pra Jack, explicar que queria ficar sozinho e tal. Mas ela não entendia nada. Depois de um tempo, ela foi me contar que eu não estava só sem voz. Minha dicção estava toda zuada. Eu falava mole, tudo enrolado. Não era só um problema de não dar pra ouvir, ela ouvia, mas não dava pra entender. Achei muito doido isso, pois na minha cabeça eu soava normal, com a dicção perfeita. E ela, tadinha, ficou meio desesperada e saiu chorando do quarto, pois percebia que eu queria dizer algo, mas não entendia o que eu falava, e achou que eu ia ficar assim pra sempre, como se minha fala tivesse sido afetada por algum lance neurológico, sei lá. E ela foi e falou com minha mãe, que voltou ao quarto com meu irmão. Aí eu consegui fazer eles entenderem que eu queria ficar sozinho, e eles foram embora. Queria me lembrar o que me deu, porque, de qualquer forma, as visitas eram só de meia hora. E eu não achava que aquela era a primeira vez que eu via a Jack depois do coma, ela que me contou depois. O fato é que eu ainda estava muito doido!
E passaram-se uns dias e eu, sentindo minha voz melhor, resolvi contar o que tinha acontecido. Estavam no quarto o Du, o Daniel e minha mãe. O Du estava do meu lado esquerdo e eu virei pra ele e falei: “Mas vocês sabem porque eu estou aqui?”. Eles olharam um pro outro, com uma cara de “que que ele tá falando?”. E nessas entrou o enfermeiro Israel. Eu apontei pra ele e disse: “Esse é o cara! Ele me salvou!” heheh Coitado, o Israel não entendeu nada. E eu falei: “É, porque ele me pegou na calçada, eu estava jogado no chão e ele me levou pra dentro do hospital!”. O Daniel contou que, nessa hora, sem entender nada, achou que eu tinha, em um surto, tentado fugir do hospital e cheguei até a calçada me arrastando! Falou que quase foi quebrar o pau com o pessoal, que tinha deixado eu fazer isso! Heheh. E então eu comecei a contar tudo. Fiquei um tempão, contei o que tinha acontecido comigo. Meu, se alguém tivesse um gravador nessa hora ia ser animal, porque eu estava com tudo ainda fresco na cabeça, lembrava de tudo direitinho, cada detalhe, a ordem que as coisas aconteceram! Bom, aí eles viraram pra mim e falaram que tinha sido sonho. E eu: “que sonho, eu fui mesmo, o nome da cidade é tal, a boa velhinha chamava tal!”. E falei que, se me dessem um cavalo, eu poderia tocar quantos bois eles quisessem, pra provar que eu tinha aprendido! E como aprenderia estando, como eles diziam, naquela cama a tanto tempo? Não, era impossível ter sido sonho. Eu estava convicto. Aí o Dú perguntou quantos dias tinha durado essa minha viagem pelo Brasil. Eu disse: “cinco dias!”. E ele falou que tinha sido exatamente o tempo que eu fiquei entubado. Nessa hora eu passei a desconfiar que pudesse ter sido sonho.
Mas foi um lance muito complexo, confuso, isso tudo. Não é assim, foi um sonho e pronto. Até hoje, nas minhas lembranças, eu confundo um pouco, não tenho certeza se algumas situações realmente aconteceram ou não. E na verdade, não é certo dizer que o que rolou nesse sonho não aconteceu. Porque, assim, sou meio ignorante no assunto, mas a gente tem vários níveis de consciência. E naqueles cinco dias, eu não estava vivendo nessa realidade, aqui e agora. Mas eu estava vivendo, sim. As coisas aconteciam com uma lógica nesse outro nível de consciência em que eu estava. É que eu lembro agora só como flashs, sem o lance de tempo e espaço, o que faz as histórias ficarem sem muito nexo. Mas não foi assim que aconteceu. Era tudo muito natural. Tinha, sei lá, uma linha de tempo... eu dormia a noite, por exemplo. Senão, também, eu não levaria tanto tempo acreditando ter vivido, de fato, aquilo tudo! Sério, eles demoraram a me convencer que eu estive o tempo todo no hospital, entubado e babando. E a minha conclusão, hoje, é que eu vivi tudo aquilo, sim. É difícil entender, eu imagino, porque quando falamos em sonho e logo se imagina aquele que todo mundo tem a noite... Que uns lembram mais, outros menos, mas todo mundo tem. Só que foi diferente, foi muito mais profundo e intenso. Foi mais real. É isso, eu vivi aquilo tudo, em um outro nível de consciência, mas vivi.              
Ah, e outra coisa, essa história de luz, de ver uma luz e ir atrás. Comigo, não rolou! Muita gente me perguntou se eu vi essa tal dessa luz. Eu não vi luz nenhuma! E se for ver, é até bonito, né: “Oh, eu vi uma luz e fui atrás, não me rendi a morte, oh!”. Ah vá! Eu nem sabia que estava quase morrendo! Só soube quando me contaram, depois de acordado. Eu acho que não tem como, estando numa outra dimensão, você saber que está em outra dimensão! Bom, sei lá, não sou entendido do assunto, falo mais pela experiência que tive. Cada experiência é única, assim como cada pessoa é única, né. O que eu acho é que cada um que passa por isso, vive de uma forma, de acordo com a intensidade/gravidade da situação, as lembranças da sua vida, os símbolos culturais que acumulou... Enfim, só faltava agora ter um padrão, né: “Quando se está em coma, quase morrendo, você vai ver uma luz. Aí corre atrás dessa luz, senão você está fodido!” Heheh.
Bom, vou dormir. Um beijo pra todo mundo!

domingo, 13 de fevereiro de 2011

EPOPÉIA 10

Oooooooooba!
                E aí, belezinha? Por aqui tudo certo! Não tem nenhuma novidade. Então vou contar um pouquinho mais do sonho que eu tive durante a epopéia.
                Um lance estranho que rolou quando eu estava meio que acordando era nas horas que eu fechava o olho. Era muito doido. Eu estava acordado, e era só fechar o olho que, na hora, eu via coisas. Mas era instantâneo. Era fechar os olhos que, no mesmo segundo, apareciam umas imagens. Eu tentava dormir, mas não rolava. Eu ficava tentando imaginar um lance preto, sabe, igual quando você quer dormir, mas a cabeça não para de pensar em mil coisas. Eu ficava: “pensa preto, tudo escuro... vai porra!”, mas não rolava. E eu abria o olho mas, ao fechar, muitas vezes eu voltava a ver as mesmas coisas, estava no mesmo lugar, mesmo sonho. Eu lembro algumas coisas, tipo eu olhar em volta e ver um oceano gigante. E eu no meio desse mar gigante sem nenhum barco, prancha, nada. Mas também eu não afundava... Eu estava meio que sentado no mar. Outra hora eu fechava o olho e caia uma chuva de bebês vestidos de ursinho de pelúcia! É, pois é, isso mesmo! E eu ficava na nóia de que todos iam morrer espatifados no chão, mas eu olhava pra baixo e eles continuavam caindo, não paravam de cair... Eu ficava olhando e eles iam ficando cada vez mais pequenos na minha visão até perder de vista. Teve chuva de cocô também! Sério! Mas eu não era atingido, continuava limpinho. E também não fedia, então eu nem encanei, fiquei sussa com a chuva de cocô! heheh. É, porque chegou uma hora que eu comecei a nem me preocupar. Eu sabia que ao fechar os olhos eu ia ver coisas. Comecei até a me divertir, tipo: “o  que vai vir agora, vamos ver!”, e fechava os olhos. E não é que eu usava a imaginação, ou aparecia algo que eu pudesse estar pensando antes, sei lá. Ou você acha que em algum momento eu pensei em bebês caindo do céu em roupas de pelúcia? E não, não estava também pensando em ter filhos... já que é isso que falam quando conto essa parte do sonho: “ah, no seu inconsciente, você quer....” Não, não queria, e continuo não querendo! Mais pra frente, daqui uns anos, vou ter uns três, pelo menos. Mas bem mais pra frente! Por enquanto, prefiro me divertir com o bebê dos outros!
                Ah, um lance doido que aconteceu foi uma vez que eu fechei os olhos e me vi preso numa cadeira, que estava no meio de um trilho do metrô, e o trem vindo. Nossa, aí fiquei desesperado! Tomei o maior susto, dei um berro (ou tentei dar um... na minha cabeça foi um puta berro!). Abri o olho na hora e não queria fechar, nem a pau! Segurei ele aberto um tempão. Fiquei com muito medo, essa hora acho que eu me confundi, sei lá, não tinha tanta certeza que era só sonho, achei que se fechasse ia dar merda. Fiquei com o olho aberto o máximo de tempo que consegui, até arder muito. Aí quando eu fechei eu não estava mais no trilho. Não lembro onde estava, mas não fui atingido pelo trem. Mas foi muito doida a sensação, eu tenho direitinho a cena na minha cabeça, o trem estava vindo a milhão, a uns 30 metros de mim. Lembro que até segurei as pálpebras com as mãos, pra não deixar fechar! Meu coração disparou, a maquininha que media os batimentos do coração começou até a apitar. E pra explicar para os enfermeiros, que vieram correndo: “é, então, é que estava vindo um trem na minha direção!” Aí que o apelido de louquinho da UTI pegou, de vez!
Eu tive um outro sonho também que foi engraçado. Mas esse foi depois, eu já estava até na semi-intensiva, tinha saído da UTI. Foi sonho a noite e tal, mais “normal”, de dormir, sonhar, acordar e ver que foi sonho. Nesse, eu era super amigo daquele Jack Black, o ator lá! Muito nada a ver né. Nunca nem assisti um filme dele, não sei de onde eu tirei essa! E o lance é que eu tinha acabado de sair do hospital e estava dando rolê de carro. Aí eu bati feio e acabei com o carro. Comigo não aconteceu nada, nem com ele. E ele era meio sem noção, falou: “é, desencana, deixa o carro aí e vamos a pé”. E a gente foi pra um barzinho, desses botecão meio padoca, de esquina. E era cedo, tipo uma da tarde. E eu ficava pensando: "pô, eu não podia beber essa breja". Mas bebia. E aí me deu uma puta vontade de fumar.
Aqui vale um parênteses, uma observação, só pra contextualizar a parada. Eu fumei por um bom tempo. Desde os quinze anos. E quando fui entubado, um dos motivos foi meu pulmão. Mas nem teve a ver com o fato de eu fumar. Acho que foi mais por eu ter ficado muito fraco, sem me movimentar na cama... Com a grande ajuda do ótimo e atencioso pessoal do São Luis, que cuidou muito bem desses problemas gerados quando o paciente fica muito tempo acamado. Minhas costas ficaram podres também, já que eles não me mexiam, nem nada. E é importante quando o paciente não pode se mexer, que tenha suas pernas movimentadas, que o coloquem em uma posição mais vertical. Isso é básico, eu acho, senão ferra a coluna e começa a acumular líquido no pulmão, como no meu caso. Mas eles acharam melhor não. Claro, né, depois era só mandar eu colocar aquela mascara de BiPap, pra tentar ressuscitar o pulmão. As costas não, essas reclamam até hoje! Está certo que eu tirei dois tumores, não tinha como não ter muitas dores meio que crônicas. Mas acho que, pelo menos, eu teria gastado menos dinheiro com fisioterapia, né! Aliás, me dá uma sensação muito ruim quando penso no quanto que eu poderia ter economizado, de grana mesmo... nem falo de sofrimento, se eu tivesse tido um pouco mais de atenção por parte de alguns profissionais que me trataram durante esses anos. E não cabe aqui aquele discurso de que a saúde é que importa e tal... É claro que é, eu sei! Só que foi muita grana, mas muita mesmo, que minha família gastou e poderia ter economizado. Mas prefiro não pensar nisso. Tirando que, com certeza, meus pais não vão gostar de eu ter tocado nesse assunto aqui. E também, é aquele lance, as coisas acontecem do jeito que têm que acontecer... E quando pensar isso não me convence, penso então que o que passou, passou, né! O que não rola é ficar com coisa ruim guardada, te amargurando. Quando fico assim, faço isso, tento de todas aas formas tirar da cabeça, antes de chegar ao coração, porque aí fica mais complicado. Não é sempre que dá certo, mas eu sempre tento! rs
Mas voltando ao lance do cigarro. Eu já estava querendo parar, mas não conseguia. Eu nunca fumei muito, na verdade. Em dias de semana, ou melhor, dias que eu não bebia, eu fumava uns quatro cigarros. Mas sempre Marlborão vermelho, né, isso que era foda. Tentei várias vezes fumar algum cigarro light, mas não rolava. Sempre chegava a mesma conclusão: se era pra estragar meu pulmão, que fosse com prazer né, não só pra sustentar o vício! Sim, eu também sei me convencer a fazer merda! O engraçado, na verdade não sei se engraçado, é que eu sempre pensava que teria que acontecer alguma coisa meio grande pra eu parar de fumar. E eu estava certo né, dei uma de Mãe Dinah! Heheh.
Mas então, voltando ao sonho (tá foda né, é um tal de voltando a isso, voltando aquilo... Foco Renato, foco! rs). A gente estava no boteco tomando cerveja e fumei um cigarro com meu brother Jack Black. E nesse sonho eu tinha passado por toda a treta, era bem real. Eu não poderia fumar. Mas não agüentei e comprei um cigarro. Fiquei muito arrependido, mas não parava de fumar. E a gente ia indo pra minha casa. E eu ficava pensando “Puta, vou chegar com o maior fedor de cigarro, puta cagada!” Mas antes de chegar em casa eu acordei. Nossa, senti um puta alívio quando percebi que estava no hospital. Não lembro quem estava no quarto na hora, que disse que dei uns tragos numa caneta Bic! Heheh Mas lembro que foi muito bom perceber que foi um sonho e eu não tinha fumado! Foi super significativo, fiquei muito feliz por não ter fumado. Era algo que eu pensava muito no hospital, tinha muita vontade de fumar, Eu pensava muito em como eu iria fazer pra não fumar quando saísse do hospital. Foi muito difícil no começo, mas agora já faz três anos que eu não fumo. E nem tenho vontade mais. Legal, né? É um dos bons frutos dessa treta toda.
Tem outra história que eu achei interessante. Assim, eu tinha certeza que tinha sido mal tratado pelos enfermeiros. Não sei o que me trazia essa sensação. Porque não consigo imaginar que algum deles tenha realmente me feito qualquer coisa. Acho que eu tinha essa sensação devido a falta de respeito que vinha de alguns médicos, tipo a Japa mal amada, que não tinham a menor crença de que eu ia viver e, por isso, estavam sempre em conflito com minha família. Acho que essa energia negativa que alguns tinham em relação a minha recuperação chegava a mim dessa forma. Porque era um lance muito forte, tinha uns enfermeiros que eu tinha um pouco de medo até. E teve um dia em que eu estava conversando com aquela enfermeira mãezona, que eu gostava, ainda na UTI, e perguntei se eu poderia escolher os enfermeiros, ou pelo menos evitar um ou outro. Ela disse que eu poderia tentar, mas que era difícil. E nesse dia, ela foi embora e veio um que eu não gostava, que eu tinha medo mesmo. Aí quando o vi, pensei: “Ih, fudeu! Esse cara é sacana, preciso fazer ele ficar meu amigo!” E resolvi que ia contar tudo que tinha acontecido comigo pra ele ficar com pena de mim e me tratar bem.  Meu, aí contei tudo, num tom bem melancólico, bem reclamando da vida. Falei do tumor das costas, do seqüestro, do prejú de mil reais com a batida do meu carro, e que depois disso tudo eu ainda quase morri e tal! Até chorei, contando. Nossa, deu certo! O cara ficou todo sensibilizado, ficou amigão meu, super solícito e tal. Heheh.
Eita, escrevi demais. De novo! O pior é que eu tento escrever uns posts mais curtos, mas quando vou ver, já foi! Bom, agora vou dormir! Um beijo pra todo mundo. Com muita saudade! A ansiedade está grande pra voltar e encontrar todo mundo! É aquela história, eu estou no elevador... Mas parece que esse prédio tem uns 200 andares e eu moro na cobertura!

sábado, 12 de fevereiro de 2011


Faaaala!
                Então, nenhuma novidade. Agora é só espera. Na verdade, pra não falar que não rolou nada, o corte da cirurgia da borseta resolveu encher o saco. Ontem, quando voltamos do shopping, eu tirei o casaco e minha camiseta tava super suja, de uma secreção meio amarelada e vermelha. A camiseta estava encharcada, na região do corte. Com muito dessa gosma. Bem nojento! Ah, sei que é meio... desagradáve de imaginar, mas não tem outro jeito, o negócio era nojento mesmo, ué. E acho que já deu pra perceber que não é uma boa ler esse blog antes, ou depois, de comer, né! Você pode encontrar cenas não muito belas! E o pior é que quando a gente estava voltando, na van do hotel, eu comecei a sentir o maior fedor! Até comentei com minha mãe, tinha certeza que alguém tinha peidado! E no hall do hotel, fiquei encarando, irritado, o cara que esperava o elevador com a gente, porque tinha certeza que ele tinha soltado uma bufa! Só quando cheguei em casa e tirei o casaco, que eu vi que o cheirão tava vindo do corte! Heheh. Meu, o lance cheirava muito mal! Aí eu limpei, lavei bem no banho e tal, e fiquei apertando. Saiu muita coisa! Demorou pra parar de sair.
A minha mãe já queria ir ontem mesmo pro hospital. Mas era oito horas da noite, nem teria ninguém lá. Então mandei um e-mail pro Rodrigo explicando o que tinha acontecido, falando que iria hoje cedo ao hospital. Minha mãe já estava achando que era coisa séria. Eu não, achei que eu estaria me sentindo mal, com febre e tal. Então, hoje (sexta-feira) cedo o Rodrigo foi lá ver. Apertou e deu uma espremida em volta. E ficou tranqüilo. Disse que estava com medo de ser uma fistula. Mas não, foi só uma infecçãozinha sussa! Ele tirou uns pontos, grampos, pra abrir uns furos no corte pra sair o líquido fedido, e pronto! Se fosse fístula eu estava ferrado! Ia ter que abrir de novo, cirurgia, pra ver o que estava acontecendo lá dentro... Ih, ia ser o maior rolo, ia atrasar tudo aqui!
Só acho que vai demorar mais pra fechar a cicatriz, com esses buracos. E nossa, ficou bem feio! Bom, mas aí também, se eu for me preocupar com as cicatrizes... Mas estou sussa. Já falei né, vou até me divertir com elas! A única encheção vai ser quando for tomar sol. É, porque a coisa mais chata de ir pra praia é passar protetor, né! Puta saco, você quer ir logo entrar no mar, mas não, tem que ficar passando aquelas paradas, fica todo melecado... Nunca tive paciência pra isso. Mas agora vou passar, certeza. Senão as cicatrizes ficam mais barbárie ainda! Mas, olha, não vejo a hora de ter essa preocupação. Estar na praia e ter que passar protetor... Que problemão, né! Heheh. É, isso é um fato constatado. Existem sim problemas legais de se ter. Com certeza! Os meus últimos não estão sendo os mais divertidos, mas só por enquanto. Não vejo a hora de voltar a ter aqueles problemas mais... normais, vai!
Mas sem drama. É que, de certa forma, eu, aqui nesse stand by que me coloquei pra resolver minha vida, me afastei de muitos problemas. São problemas que só existem quando se está vivendo, e como eu dei essa parada, eu os anulei. Por exemplo, não lembro a última vez que reclamei de ter que acordar cedo! É, porque uma coisa é ter que acordar cedo, tendo dormido pouco, pra ir trabalhar. Outra coisa é acordar cedo, com sono, pra ir pro hospital. No hospital eu chego lá e fico de boa... Não estou falando que é legal um monte de gente te examinando, furando o braço, você fazer uns exames doidos e tal. Mas eu não uso a cabeça, não preciso pensar... Até durmo na espera, as vezes. E isso que é foda quando você vai trabalhar sem ter dormido direito. Demora pro tico se entender com o teco! Mas esse é um problema que eu vou gostar de voltar a ter! Não, calma, eu não fiquei louco, pelo menos não a ponto de estar ansioso pra ter pouco tempo de sono! Ainda mais eu, que adoro dormir. O que eu quero dizer é que essa situação representaria a retomada da minha vida, acordando cedo pra trabalhar, fazendo minhas coisas e tal... Naquela correria que eu tanto reclamava! Acho até que vai demorar pra eu voltar a reclamar disso! É, porque eu sou pentelho, e logo volto a reclamar! Por isso que eu falo, aproveitem, a folga de vocês está acabando! Daqui a pouco estou aí, enchendo o saco de todo mundo de novo!
Aliás, só mais uma coisa, o bom de estar longe tanto tempo, por motivos como o meu, é que as pessoas só lembram das coisas boas sobre você, né! Eu fiquei  tão legal! Gostei dessa parte! E agora já era, eu sou super legal e pronto, não dá mais pra voltar atrás, hein! Heheh
Um beijo pra todo mundo! E bom fim de semana!

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

EPOPÉIA 9

Faaaala pessoal!
                Tudo bem por aí? Por aqui tudo certo! Estou me sentindo muito bem. Ainda não sinto fome, mas isso não tem atrapalhado em nada. Tenho comido muito bem, quase o mesmo tanto que comia antes de começar a treta. E não preciso forçar pra comer, como tranqüilo. Claro, ter uma cozinheira como minha mãe ajuda bastante, né. Não precisa ter fome pra comer seus pratos! E ainda mais que ela faz tudo que eu quiser, do jeito que eu quiser... É, vida de marajá, meu! Depois de tempos sem comer, agora estou só no bem bom. Depois da tempestade, a bonança! heheh
                E ontem rolou consulta com o Rodrigo. E ele estava ainda mais tranqüilo. Isso, mais até do que os resultados dos exames e o que ele fala a respeito, é o que me dá a noção de que estou, ou não, no caminho certo. É o meu recuperômetro! Heheh Beleza, essa foi ruim, eu sei... Mas, vai, vocês entenderam, né! Tipo, quando eu estava malzão, perdendo peso, com aquela rejeição e tal, ele ficava muito sério, preocupado. Não fazia brincadeira nenhuma, até me dava umas broncas. Ontem não, ele estava de bom humor, conversava com sorriso no rosto, ria das minhas piadinhas boas! Isso me mostrava que estava tudo no caminho certo, já que ele não tinha motivo pra se preocupar. E realmente, parece que está. Eu emagreci só um quilo e pouquinho, sendo que ele falou que seria normal eu emagrecer uns três. A cicatriz, que eu acho horrível, ele falou que está ótima, que não imaginava que estaria sequinha já, tão cedo. E eu falei sobre comida, sobre o lance da absorção. Aquela história de comer coisas de fácil digestão. Ele perguntou o que eu estava comendo, e eu disse que era uma dieta leve, baseada em acarajés e outros pratos da culinária baiana. Essa ele gostou, ficou meia hora rindo! Heheh. No fim ele falou que eu podia tomar mais remédio pra, digamos, segurar o ritmo das coisas aqui dentro! É, porque não lembro se falei aqui, até porque eu ainda não sabia direito. Mas eu não tenho o intestino inteiro. Tenho só o delgado, não o grosso. E o intestino grosso, no sistema digestivo, tem a função de reter os líquidos. Então, se vacilar, você acaba casando com a privada, né! Por isso que eu tomo esse remédio que ele falou, Loperamide. E está ajudando bastante. Mas com o tempo isso passa a não ser mais necessário. O intestino delgado começa a fazer a função do grosso. Integralmente. O Rodrigo falou que depois de uns anos, ao ver os órgãos, não dá pra dizer que a pessoa não tem o intestino grosso, tamanha é a adaptação que rola.
Mas é isso aí, acho que estou embalando de vez agora. Fico muito feliz de estar dando conta da minha única responsabilidade agora, que é me alimentar bem. E hoje eu saí de casa pela primeira vez desde que eu tinha colocado aquele tubo no nariz. Quase um mês! Claro que hospital não conta! Fomos ao shopping, pra variar. Foi mais pra dar uma movimentada, mesmo. Essa combinação, frio + roteiro da van, não nos deixa muitas opções! Mas me senti bem. Ainda não dá pra andar muito, pois logo começa a doer na região da cirurgia. Mas, de qualquer forma, foi bom sair. Aliás, eu estava lá comprando um lance pra beber, e colou um cara muito louco.Estava breacão. E eu até que estou entendendo bem o inglês, mas inglês de bêbado é foda. O cara chegou perguntando o que eu estava bebendo. Eu respondi, ele perguntou meu nome, e quando eu falei ele fez aquela cara de “ãh?” que todos fazem. Perguntou de onde eu era e eu falei. Até aí tudo bem. Agora olha a viagem do cara: “ah, eu sei, no Brasil vocês são muito ativos politicamente, né? Vão pras ruas brigar pelos seus direitos!” Eu não entendi, já que a gente só sai pra rua, revoltado, se o assunto é futebol. E ele continuou: “É, porque eu vi que vocês estão agora fazendo manifestações pra tirar o presidente do poder, ele é um ditador, né! E vocês estão se mobilizando! Muito legal! Mas e aí, ele já saiu, já renunciou?”. Meu, aí que eu me liguei. O cara estava achando que o Brasil era o Egito! Heheh. Aí eu desencanei de explicar, maior preguiça, imagina! E só falei que não, não tinha renunciado ainda. E o cara: “Que mother fucker! Tem que jogar mais umas bombs in his fucking ass!” heheh. Figura o cara!
Mas então, vou aproveitar agora pra contar um pouco mais do sonho doido, lá. Acho que está ficando cada vez mais confuso...
Eu estava no hospital né. Não sabia direito o que estava fazendo lá nessa hora, porque eu estava bem. Parece que eu só estava esperando alguma coisa... não poderia ir embora se não aparecesse alguém pra me levar. O problema é que eu não conseguia falar com ninguém. Aí a Stella apareceu. Eu estava na mesma cama, ou maca, da outra parte do sonho. Não lembro direito, mas teve uma história de como que ela apareceu lá... Ela participou de um trote que um pai deu na filha, uma brincadeira. Mas era um trote meio sem noção, que a menininha chorou pra caramba e tal. Eu lembro que vi esse trote pela TV e, quando vi que era a Stella, levei o maior susto. Aí, não sei como, ela foi aparecer no hospital. Na verdade, ela nem sabia que eu estava lá, foi coincidência. E ela estava bem cansada. Nós só tínhamos que esperar um pouco, me colocaram uma máscara de respiração e eu tinha que ficar com ela um tempo. A Stella ficou com a máscara também, deitada, em uma cama ao meu lado. Quando aquilo acabasse a gente ia embora. Eu fiquei tranqüilo, só pensava em contar pra ela sobre minha viagem pelo Brasil! Heheh Eu pensava muito isso durante o sonho, que ninguém ia acreditar quando eu contasse que havia rodado o Brasil todo e tal. E eu estava tão tranqüilo que consegui ficar com a máscara, e até dormi. Mas aí, quando acordei, a Stella tinha ido embora! E eu continuava lá. Fiquei sem entender “porque ela foi embora, o que aconteceu, porque não me acordou?”
Aliás, quando eu me via sozinho em algum lugar, quando não tinha enfermeiros comigo, eu começava a meio que grunhir! Sério, fazia uns sons bem estranhos, porque não conseguia falar, então eu fazia barulho o mais alto que eu conseguisse. Mas isso eu não sei em que momento que aconteceu, porque não foi só no meu sonho. Na verdade não rolou no sonho, eu acho. É difícil explicar. Porque eu realmente fazia isso. E bem alto, até disparar o alarme do quarto. E, com isso, os enfermeiros vinham correndo, mas depos ficavam irritados, porque eu não tinha motivo. Eu simplesmente não gostava, tinha medo de ficar sozinho, me dava um desespero e eu queria chamar a atenção, pra vir alguém. Eu ficava ouvindo os enfermeiros conversarem na copa e ficava até com raiva. Achava que tinha que ter alguém comigo! Quando eles vinham, depois do alarme disparar, perguntavam o que eu queria e eu não sabia. E nessas disparava o batimento do coração, eu começava a dar umas contorcidas na cama... Tudo sem que eu pudesse controlar. Simplesmente rolava. Era como se o meu corpo agisse sozinho. E ficavam me acalmando. Teve uma vez que foi até engraçado. Eu estava fazendo meus barulhos pra chamar alguém, e passou um cara que não era enfermeiro. Eu fiz uns gestos, misturados com barulho, pra ele chamar alguém. Aí, de longe, eu só ouvi isso:
- O paciente ali está chamando.
- Vê lá o que ele quer.
- Eu não, você viu o estado do cara, fazendo uns barulhos! Eu não chego perto dele,
 não senhor!

      Parece que eu assustei o tiozinho. E eu fazia tanto isso que depois de um tempo começaram a me chamar de louquinho da UTI! Heheh. Não sei, mas acho que não era por carinho, não, esse apelido...
                E mesmo depois que eu voltei do coma, eu continuava a ter muitas viagens. Teve uma enfermeira que eu lembro bem. Era uma mulher mais velha. Eu gostava dela porque era bem mãezona. Me contou que tinha três filhos. E esse dia me deram um lance pra eu dormir, porque eu não estava conseguindo. Me deram uma dose forte, eu capotei e voltei aos sonhos. E saí de taxi... Ela falou que eu estava internado a muito tempo e precisava sair. Chamou os filhos, um vascaíno e dois botafoguenses muito chatos, e rodamos a cidade inteira. Depois, na volta, estava muito calor, e eu fiquei na varanda do quarto um tempo, numa cadeira de rodas. Quando encontrei a enfermeira de novo, contei, empolgado, que tinha conhecido seus filhos, rodado São Paulo com um taxista louco, que corria pra caramba e tal! Ela só olhava e ria. E eu insistia, enquanto ela tentava, em vão, me explicar que eu estive o tempo inteiro dormindo na cama. Lembro que essa mulher era a melhor enfermeira. Ela fazia os curativos em mim no maior cuidado. Segundo ela, fazer curativo é uma arte! E meu, não é exagero não, viu. Porque tem uns que colocam de qualquer jeito, aí solta, ou então, na hora de tirar, quase arranca sua pele junto. Esse mulher não, tinho o maior carinho e tal... Durava um tempão os curativos dela.
                    É isso aí. Acho que com mais um post, eu termino esses sonhos. Aí volto pra epopéia. Quero terminar de contar ela antes de voltar. Ou melhor, terminar de escrevê-la antes que ela termine de fato! É até simbólico, né! Um beijo pra todo mundo aí!