sábado, 15 de outubro de 2011

MEU ANIVERSÁRIO!!!!

Faaaala,
                Então, hoje é sábado, quase domingo. E nesse domingo, dia 16, é meu segundo aniversário! É meu, faz um ano que eu fiz o transplante! Um ano!! Eu nem acredito! Passa muito rápido. A essa hora, 18h30, eu estava no hospital, na expectativa se iria rolar o transplante ou não. Tentava dormir pra passar o tempo, mas não rolava. A gente foi avisado da possibilidade do transplante as 11h do dia 15/10. A partir daí eu fiquei internado, nos preparativos. E o transplante só foi acontecer as 7h do dia seguinte, 16/10. Vou sempre comemorar muito esse dia! Foi quando eu recuperei o prazer de viver, no lugar da luta pra sobreviver! Era o que eu mais queria: que passasse um ano, logo! Estava tentando lembrar o que eu pensava, na época, que estaria acontecendo hoje, um ano depois. Como eu estaria e tal. Pra ser sincero, não lembro! O que pensava que seria legal, que eu lembro agora, é que, em um ano, eu não estaria tomando mais tantos remédios. Pensava “Nossa, imagina, daqui a um ano, sem vários desses comprimidos...” E, realmente, agora só tem um remédio que realmente é essencial e vital, que é o: Prograf, O Imunossupressor – tipo nome daqueles reis das antigas, rs. Mas um que eu odiava tomar, que tinha que tomar dois por dia, um tijolo de 450mg, eu parei na semana passada. Era o Valcyte, O Antiviral! E eu acho, não sei, que ele atrapalhava bem o funcionamento do meu sistema digestivo. Era meio pesado. E eu não podia esquecer-me de tomar. Agora, que eu não posso esquecer, é só o Prograf. O resto é Aspirina, pro sangue, Omeprazol, pro estômago, o Coumadim, um anticoagulante, de vez em quando um Digesan, pra acordar o povo aqui dentro. E o bom e velho Imosec, claro. Ah, eu tomo umas vitaminas também. Mas enfim, sussa. Já cheguei a tomar uns quarenta comprimidos por dia. Tinha que acordar durante a noite pra tomar. Hoje, se não me engano, são dezenove. Mas tranquilo. São, basicamente, três “grupos” por dia. Nenhum durante a noite.
          E tem um lance que rolou na hora do transplante que eu não lembro se contei. Porque na hora do "vamo pra faca!", minha mãe foi comigo até a porta da sala de cirurgia. Aí, falaram pra ela que eu iria pra UTI logo depois da cirurgia, e que era no sexto andar. Ela deveria ficar lá pra esperar por notícias sobre o andamento do transplante. E quando ela chegou no andar, não era lá a UTI. E ela começou a chorar, tadinha. ela contando: "ah, eu não achava a UTI, comecei a ficar desesperada, porque não estaria lá na hora que fossem dar notícia. Não conseguia nem andar de tanto que eu chorava. Aí apareceu uma enfermeira que me viu chorando e eu falei pra ela. Ela entendeu e me levou ao local certo!" Parece que, nesse mesmo dia, tinha ficado pronta a nova UTI, no quarto andar. E até então era no sexto. Daí a confusão! Tadinha, imagina o estado da minha velhinha. Já estava tensa comigo lá na sala de cirurgia, e ainda fica perdida no hospital! 
E, de forma geral, a minha recuperação caminhou bem nesse ano. Tive uns percalços, como a cirurgia de emergência antes de voltar pro Brasil, e aquela internação, logo que voltei pra cá. Mas agora a maré está mais calma. Está tudo certo. Como escrevi uma vez, faz muito tempo, o lance é devagar e sempre. Assim as coisas vão melhorando. Como preciso continuar engordando, tenho sido bem disciplinado na alimentação. Eu quase não como quando saio de casa. Prefiro evitar, pra não correr risco de dar um revertério. Na verdade nem é um revertério, de fato. O lance é que minha digestão é mais rápida, mesmo. Não tenho intestino grosso, né. Então, na maioria das vezes, se eu como o tanto que tenho vontade, até matar a fome, logo fico com vontade de... enfim, contemplar azulejos no banheiro, vai. E isso pode gerar uma situação complicada, já que não é todo lugar que tem os recursos necessários para esse momento tão singelo! Por exemplo, ontem fui ao Pacaembu assistir o Coringão. Aliás, fazia dois anos que eu não ia ao estádio! O último tinha sido em 2009 contra esse mesmo Botafogo! Foi animal, estava bem cheio. Só o resultado que não foi legal. E eu não agüentei ficar muito tempo em pé. As costas doíam pra cacete! Mas sentado, não dá pra ficar, você não enxerga nada. Mesmo assim, teve umas horas que eu desencanei e sentei, porque, com aquela porra daquela dor, não dava nem pra prestar atenção no jogo! Só sei que cheguei em casa quebrado. Mas valeu a pena!
E pra resolver isso, ficar zerado das costas, eu estou fazendo uma fisioterapia forte. Dou uma ripa nas sessões. E o meu fisioterapeuta não alivia! Não é esquema de esticar o bracinho pra cá e pra lá, não meu! O bicho pega! E tem que ser assim. Eu gasto cada gota de energia. E saio podrão de lá, sempre. E é o jeito, já que tiraram uma picanha de lá, e quando eu estava melhorzinho, foram lá e tiraram outra. Preciso equilibrar a bagunça que virou o meu lombo! E já fez uma baita diferença, pelo menos em relação a força. Já não fico cansado tão rápido. O que pega mesmo é essa dor nas costas. Na maioria das vezes que eu saio a noite e tal, o que me faz voltar pra casa mais cedo é essa dor. Principalmente, se é um lugar onde todos ficam em pé! Eu agüento até onde dá, mas chega uma hora que eu fico de saco cheio e canso de tentar ignorar a dor. Fica chato, eu deixo de curtir e bodeio. Ah, mas a parte legal é que, se chego em algum lugar que o pessoal está sentado, logo alguém levanta pra me dar lugar! Heheh O pessoal é gente fina comigo.
Ah, mas eu falei do jogo por causa do papo de comida, né? É sempre assim, eu começo falando de uma coisa e, quando vou ver, estou falando de outro lance nada a ver! Não que eu seja lesado. Então, voltando. A gente chegou cedo ao Pacaembu e foi a uma padaria, lá perto. Eu até pensei em comer alguma coisa e tal. Mas tinha a chance, grande, de dar merda. Literalmente. Então eu preferi ficar de boa, comi uns croissant sem recheio, tranquilo. E deu certo, no jogo não pegou nada. Imagina, só faltava essa. No meio do jogo... Aquele banheiro cheirosinho de estádio! Imagina o drama que não seria! É uma opção que eu faço. Abro mão dos prazeres da mesa – meio bicha, né! - pra poder ficar de boa e curtir o momento! Pena que não é sempre que rola. Mas quando eu consigo, fico maior orgulhoso quando chego em casa! É praticamente como se sente um ex-fumante que passa a balada sem fumar, apesar da cervejinha, que passa a balada inteira te instigando, implorando por um trago. Mas aí você só acha legal no dia seguinte, quando acorda e pensa “Puta que pariu! Não fumei durante a balada inteira! Classe!” É, bom, não sei se é a melhor comparação, na verdade. Mas é assim que eu me sinto no dia seguinte, quando consigo evitar umas paradas mais indigestas. Esquema AA, mesmo!
E minha alimentação tem sido assim, bem regrada. Por exemplo, não como lingüiça, evito carne de porco, não como salada, nada cru, fora de casa. Japonês, nem pensar! Não como muito queijo. Quase não tenho tomado refrigerante. Vou testando uns sucos. Agora estou na fase do de goiaba. Vou até enjoar, aí troco. Não tomo leite, nem iogurte. Sorvete, também não. As vezes tomo aqueles frozen yogurt, mas acho meio sem graça, já que pra ficar bom mesmo, tem que por as coberturas, que eu não posso muito. Em relação a doces é mais foda. Eu não como quase nunca bolo de chocolate, tortas com creme, recheios, essas paradas. Sanduíche, tipo x-burger, não rola. Sempre que eu penso “ah, um só é sussa, peço sem bacon!”, vou lá e como, não dá certo. Várias vezes, eu tenho vontade de comer um hot-dog, mas desencano. Se bem que esses dias eu comi, um daqueles mini, tipo de festa de criança. Não como fritura também. Pastel, eu nem lembro a última vez que comi. Caldo de cana, também. E tem outras coisas, que eu não lembro agora. Por outro lado, todo dia eu tomo um açaí. Bato com banana e mel. Fica animal! 
Assim, se for parar pra pensar, tem coisa pra caramba que eu não como. É verdade. Mas eu nem penso nisso todo dia. Já estou bem acostumado. Tanto que, quando me perguntam como está minha alimentação, se posso comer de tudo e tal, eu respondo que sim. Depois começo a pensar e ver que não é bem assim. Mas estou lidando bem com isso, na verdade. O que ferra mais é doce, mesmo. Sempre fui “do doce”. Eu tenho comido uns doces de fruta. O da moda agora é aquele de banana cristal, sabe? Como umas compotas também. Muita fruta. Tive que rever meu conceito de que fruta não é sobremesa! Na verdade, minha alimentação é saudável pra cacete! Não que eu queira ser saudável. Eu até acho legal. Claro, só um imbecil acharia ruim ser saudável. Mas não é o motivo. É mais prático mesmo, dia a dia: se eu comer esse macarrão aos quatro queijos, não consigo absorver nada, vai tudo embora. Logo, emagreço. Agora, se eu comer esse macarrão ao sugo, não vai rolar barbárie nenhuma aqui dentro, e eu vou me sentir melhor. Ou seja, o lance de ser saudável, vem de tabela. Praticamente involuntário! E posso dizer que estou conseguindo lidar até que bem com isso. Acho que, se eu fosse um gordinho precisando emagrecer, ia ser sussa! Porque é uma situação mais simples. É, porque o problema de o cara comer uma torta de chocolate é que ele vai quebrar a balança. Mas isso vem depois. Na hora vai sentir só o prazer. No máximo um peso na consciência depois. No meu caso, não. O bicho pega na hora. Além de eu emagrecer, e rolar uma barbárie na minha barriga, eu vou ter que correr atrás de um lugar pra poder meditar! Dependendo de onde eu estiver, gera um constrangimento.
E o mais importante de tudo, que eu sempre lembro quando fico puto ao ter que evitar uma linguicinha num churras, é que até pouco tempo atrás, eu não podia comer porra nenhuma, né! Então, pra quem não comia nada, até folhas de endívia é algo suculento, vai! E outra coisa, desde que eu saí da última internação, já aqui no Brasil, eu engordei seis quilos! Essa é a principal recompensa pra chatice toda de ter que lidar com essas restrições. Ainda estou bem magro. Mas com mais uns seis, sete quilos eu fico próximo do que eu era. Aí, também, já dá pra dar uma barbarizada, de leve, na alimentação. Isso porque já vou estar em um peso mais seguro.
 Bom, é isso. Por mais que eu já tenha falado sobre esse assunto alimentação muitas vezes, é algo que está sempre mudando. De acordo com a evolução da minha recuperação. E é o que está pegando mais, mesmo. Então, se mantém um assunto atual! rs E também, eu quis falar disso agora porque esse post é meio que um relatório de um ano do transplante... Como está o meu corpo depois de um ano que recebeu órgãos novos e tal. Mas, o mais importante de tudo é que está rolando uma integração boa aqui dentro. O povo se entendeu muito bem. Isso é o que importa! Nunca teve nem um início de rejeição. E é esse o maior medo de quando se faz um transplante. Ainda mais envolvendo o intestino, que é o órgão que tem o maior risco de rejeição, em qualquer transplante. E, com o tempo, meu intestino vai funcionando cada vez melhor, meu corpo vai ficando cada vem mais ninja, e é isso aí! 
O negócio é comemorar esse aniversário! E o ano tem sido muito legal... Ganhei um sobrinho lindo, o meu irmão mais velho, o Daniel, também está esperando um herdeiro... Enfim, sem falar em outras coisas legais que eu estou vivendo. Mas acho que esses dois fatos ilustram bem a nova fase, bem melhor, pra todos nós! Bom, eu estou falando aqui assim, todo empolgado... Mas, assim, se alguém não estiver muito bem, me dá um toque! Heheh Estou aqui, mais do que querendo retribuir tudo, de todo mundo! 
Mas legal, agora vou ter dois aniversários por ano! Um no começo do ano, e outro mais pro final! Classe! E esse eu vou comemorar em São Joaquim! Tia Ana, prepara as esfihas, que eu estou chegando! heheheh
         
         Beijo pra todo mundo!

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

EPOPÉIA 21

Oooopa!
Então, vou continuar com a Epopéia! Pra não perder o embalo! rs
Bom, então eu acordei da cirurgia, achando que tinha ido fazer uma cirurgia simples, só pra resolver o lance de não conseguir engolir saliva! Quando vou ver, estou todo cheio dos tubos em uma sala, sozinho e sem conseguir falar. Aí, corta - é assim que eu vivia o lance, sem muita conexão entre os momentos. Eu via as pessoas da minha família, mas não me comunicava com ninguém. Não conseguia falar nada. Eu só observava, bem lesado.  
Até que uma enfermeira veio e perguntou “como é que está o corte?”. E eu levantei a camisola... ou avental, sei lá como chama essa elegante vestimenta. Nisso, eu vi um monte de esparadrapo e comecei a tirar. “Que porra é essa?”, eu pensei. Aí eu vi um pedaço do “x” que estava na minha barriga. Mas eu estava tão lesado ainda, que só pensei “ih!” E nem fiquei tentando adivinhar o acontecido. Como eu disse, não tenho muita noção do tempo que levou de um momento ao outro. Mas depois disso apareceu o Fabio Ferreira, que havia feito a cirurgia. Perguntei, daquele jeito, o que tinha acontecido, e ele disse que minha família viria me explicar depois. Que eu devia ficar quieto por enquanto pra recuperar, pois havia sido uma grande cirurgia. E realmente, eu estava sem voz, só sussurava um pouco. E não entendia direito as coisas. Mas ele disse que eu estava bem. Minha família estava esperando que eu pudesse conversar melhor, pra então me contar o que tinha rolado.
Mas eis que adentra ao quarto da UTI uma médica da equipe de assistentes do Paulo Hoff. Nós as chamávamos, carinhosamente, de Pauletes. Não por nada, apenas porque eram várias, e assim ficava mais fácil. Ao invés de falar “aquela, que eu não lembro o nome, da equipe do Paulo Hoff...” Você vê que “Paulete”, facilitava, né? Pois é, foi só por isso. E eu perguntei pra ela, assim como fazia sempre que via alguém, o que tinha acontecido:
- Você não sabe, ainda?
- Não!
- Tiraram o tumor inteiro!
- Puta merda, que animal, sério?
- Sim! Mas tiraram seu intestino, também!
- Ãh?
                Aí eu fiquei um tempo olhando pra minha barriga. Não caiu a ficha, por uns minutos. E depois eu até parei de pensar nisso. Acho que minha cabeça ainda estava voltando a funcionar depois da cirurgia, sei lá. Não fazia as sinapses, sabe?
                Quando minha família ficou sabendo que ela tinha me falado, assim, sem muito jeito, ficaram bem irritados. Queriam dar a notícia da forma mais suave possível. E correram pra tentar melhorar a situação. Não sei, mas acho que a primeira pessoa que apareceu depois disso foi meu pai. Eu ainda estava com dificuldade pra falar, e pra entender as coisas. Mas esse momento eu lembro direitinho... Bom, isso se o lance aconteceu como eu tenho guardado na memória, né. Tem muita coisa que eu lembro de um jeito, e quando comento com alguém que estava junto, me falam que foi diferente. Essas paradas que dão pra te sedar e você dormir, demoram a parar seu efeito. Depois que você acorda, fica tudo confuso por um tempo. E quando meu pai entrou, foi quando eu estava melhorzinho, conseguindo entender o mínimo. Mas logo cansava de falar, a voz parava.
                Então ele me explicou o que rolou. Foi a primeira vez que me explicaram, mesmo. Antes disso, a Paulete tinha apenas vomitado a informação. Mas me lembro que, da mesma forma que nas outras cirurgias, eu me senti mais bem do que mal ao perceber que sobrevivi de algo difícil. A primeira sensação que vem é de vitória. Até porque você ainda está meio anestesiado, física e psicologicamente. Então não sofre, e nem imagina o que vai sofrer. E sempre que falam isso, tirando a Paulete, falam de uma forma positiva. Claro, pra amenizar. Meu pai falou da forma mais positiva possível! Ajuda, sim. E eu sempre fiz assim, quando dava, me deixava acreditar muito fácil, também. É o jeito. Tem que tentar encarar sempre do melhor prisma possível, pra situação ficar menos difícil de lidar. Ou melhor, ver o lado bom das coisas, né? E nesse caso, o lance era pensar no fato de que o tumor tinha sido extraído.
                Não me lembro bem dos momentos logo depois disso. Assim, as horas, primeiros dias, logo depois que eu me vi sem intestino. É que eu estava bem doido ainda, eu acho. Aquelas coisas que rolam quando eu fico num nível de consciência meio alterado. Eu não conseguia dormir nem a pau! Via um monte de coisa. Se eu fechava o olho, vinha uma cor marrom, ficava tudo escuro. E essa parada marrom ia se afastando, e conforme se afastava eu via que era um gorila gigante, tipo King Kong. E eu estava me afastando dele. Então ele ficava cada vez menor. Mas se eu fechasse o olho, começava tudo de novo. No começo até achei legal, depois que passou o medo. Eu pensava "ah, já fiquei assim antes, eu lembrava, e dessa vez eu vou aproveitar!" Mas na sétima vez que eu comecei a me a incomodar. É, porque eu fechava o olho pra tentar dormir, e lá estava eu saindo do ombro do King Kong. Eu tomava um lance forte pra dormir. E com muito tempo sem dormir, você começa a sonhar acordado, eu acho. Ainda mais com uns remédios tarja preta e morfina. Dessa vez, eu me lembro de estar olhado pro Dudu, e ele está lá embaixo, na poltrona da UTI. Tipo, uns quatro andares pra baixo.
E o que mais me deixava maluco era que não parava a música da UTI. É, porque na minha cabeça, tinham acabado de reformar o hospital. Afinal, era um novo Sírio Libanês, ao lado do aeroporto de Guarulhos! Não sei se falei isso já, mas eu achava que o hospital era em Guarulhos. E ficava impressionado como o pessoal ia pra casa e voltava tão rápido! A Jack, que chegava falando que tinha ido de ônibus... Mas o doido é que eu não comentava isso com ninguém. Só pensava em quão estranho era isso, e boa! É, porque se eu falasse, alguém provavelmente falaria “não viaja, animal, o Sírio é perto de casa e não reformou nada!”
Mas, enfim... E nessa reforma tinham colocado aqueles adesivos de taxi, nas portas de vidro dos quartos da UTI. E esses adesivos eram capas de discos antigos de rock, e cartazes de filmes. Tinha Pulp Fiction, Dona Flor e seus dois maridos, Carandiru... E de música, eram os álbuns que tocavam o dia inteiro. Até o meio dia, tocava rock e música brasileira, e até meia noite, rock gringo. Raul, Cazuza, Beatles, Rolling Stones, Gilberto Gil, Alceu Valença, The Mamas and The Papas – que eu só fui ouvir um cd inteiro depois dessa internação. Tinha inclusive uma música que não existe, na verdade. Fui descobrir depois. Eu pedia pro Du procurar no Google, e falava até o nome dela pra ele. Chamava Pedro Brasileiro. Eu queria muito lembrar a letra. Era um lance como uma competição de músicos. De um lado era Fagner, Alceu, Zé Ramalho, Almir Sater, Elba e uns outros. Do outro era Gil, Caetano, Chico, Gal... e mais outros da tropicália, como Mutantes e Tom Zé. Não lembro direito. Era meio que um repente em grupo! Um grupo desafiando o outro. Mas sem o ritmo do repente. E lembro que a Gal era amiga dos dois grupos, e que no fim, sempre eles terminavam amigos! Do som gringo, a competição era menos original, entre Beatles e Rolling Stones. Tipo, os Beatles eram os bonzinhos e os Stones, os do mal. E tocava Black Sabbath, Led Zeppelin e AC/DC também! É meu, não tinha nada de samba ou chorinho no meu sonho. Era mais rock´n´roll, mesmo! rs.
E também, no começo achei legal. “Nossa, olha a sonzeira do Sírio! Vários adesivos legais! Olha esse Paulo Hoff, meu!” rs É, porque tocava um monte de músicas que eu gosto. Claro, era meu sonho! Doido isso! Se você for pensar, acho que era a forma que meu inconciente, muito gente boa, achou pra amenizar meu sofrimento. Pondo música boa pra eu ouvir e me distrair. Eu não gostava de por a mascara de Bipap, porque era muito barulhenta e eu não ouvia as músicas. Mas depois, comecei a ficar de saco cheio das músicas. Porque eram as mesmas todos os dias. Na mesma ordem. Eu sabia que horas eram no dia, mais ou menos, pelas músicas que estavam tocando. E isso me lembrou uma viagem que fizemos, pra Praia da Ferrugem, no sul. Eu, o João, o Luciano e o Pimenta. Há uns 10 anos. Ninguem tinha relógio, a gente sabia que horas eram na balada, pelas músicas. Acho que em dez dias de balada, tocou sempre a mesma sequência! Era a época que surgia aquela do “vô passa cerol na mão...” E tocava também uma outra muito ruim, do “papo de jacaré”, que era até engraçada, de tão ruim! Mas tocavam músicas boas também... Enfim, lembrei disso durante essa “viagem” no Sírio.
E essas músicas não me deixavam dormir, né. Me lembro que eu pensava “ih, já tá tocando Barão, daqui a pouco as enfermeiras entram pra tirar os sinais vitais, e eu não consegui dormir nada, saco!” E eu fiquei muitos dias sem dormir. Ou “Opa, tá tocando Beach Boys, é hora das visitas!” Sério meu, e isso rolou por vários dias. Tocava Raimundos também. Sabe aquela do banquinho da bicicleta? rs Ah, eu achava que estava sempre mudando de quarto. E gostava, pois aí via os adesivos dos outros quartos e tal.. Eu achava muito curioso isso. Ficava pensando "que legal, o Sírio se tornando um lugar mais agradável, distraindo os pacientes... Deu certo!" rs 
Então é isso, depois eu continuo! Valeu aí, e um beijo e um abraço pra todo mundo!