segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Oooopa!

                Então, hoje não tem novidade. Agora só na 5ª. feira, quando voltar lá pra conversar com o Rodrigo, tirar o tubo e ver se marco a cirurgia da borseta. Mas estou bem animado com os próximos passos. Eu estou comendo quase normalmente. Acho que quando tirar o tubo da garganta, aí já era. Mas isso eu só vou saber quando tirar mesmo. De qualquer forma, estou bem otimista, e muito ansioso. Me sinto muito bem. Não vejo nada que possa atrapalhar.
                A ansiedade é que está incontrolável, agora! Nossa! Sabe quando você está com muita vontade de fazer xixi, bem apertado mesmo. Aí você segura, agüenta e tal, por três horas, naquele puta trânsito. Mas quando chega em casa e pega o elevador, aí o bicho pega, você quase faz nas calças! Pois é, eu e minha mãe estamos no elevador! É impossível pensar que tudo bem, já estamos quase no final, o pior já passou e tal. Não tem como! É, porque antes não tínhamos perspectiva nenhuma de voltar! Então não havia expectativa também! Agora não. Agora eu sei que a hora de voltar está próxima! Então eu só penso nisso! Quero muito ter já uma data pra voltar, poder pensar no dia e começar a contagem regressiva!
Ah, e na quinta-feira passada meu pai foi embora! Fomos levá-lo aeroporto e ficamos lá até ele embarcar. Como eu queria estar indo no lugar dele! Eita, fiquei só imaginando eu lá, esperando a hora do nosso vôo... Imagina só! Mas vocês não tem idéia (ou tem, né) como minha mãe ficou toda chorosa! Mas é sempre assim. Quando a Stella foi, ela chorou “ai como a gente vai ficar sem a Nhéinha aqui?”. Depois foi o Dudu. “Aaaah Rê, eu não queria que o Dú fosse embora!”. Agora meu pai. “Aaaaaah e agora Rê?”. Aí faz o biquinho, o nariz fica vermelho e já era! Mas é estranho mesmo, de repente a casa fica muito quieta. O Dú ficou quase um mês, meu pai ficou um mês e meio. E eles agitavam bastante. As vezes eu até ficava cansado, mas na verdade era bom, distraía, fazia o tempo passar mais rápido. Agora vamos ter que acostumar com a calmaria, de novo. Vamos terminar nossa aventura como começamos: só nós dois!
E é um saco esse negócio de ficar se despedindo, falando tchau. Quando saímos do Brasil já foi muito ruim. Uma sensação horrível, na verdade. Não sabíamos o que nos esperava. E nem por quanto tempo estaríamos longe. Mesmo assim, eu vim com a melhor das expectativas em relação ao tempo. Se me perguntassem, eu falava sempre em uns três meses. No fundo, acho que eu não acreditava muito nisso. Mas que eu tentava, ah tentava! Só que na primeira consulta o Rodrigo já falou “nem pense nisso, pense só na sua saúde, você veio aqui se curar, e o tempo que precisar pra isso, vai ser”. E foi com essa racionalidade que eu procurei encarar isso tudo. Mas não é saudade, só, o problema. Claro que essa é a pior parte de tudo, ficar longe da namorada e tal. Acho até que já falei disso. Com certeza é a maior fonte de cabelos brancos, essa saudade. Mas não é só isso. Eu sinto como se o mundo todo estivesse rodando, todo mundo tocando a vida, e eu não. É como se eu tivesse saído do mundo. Pior, na verdade. Eu deixei de existir, de certa forma. Mas calma, sem o drama dessa frase. Digo num sentido prático, mesmo. Não dá pra fingir que estou vivendo minha vida. Eu posso até estar aprendendo, na verdade estou aprendendo muita coisa nesse tempo. Mas tocando minha vida eu não estou. Estou consertando ela, pra poder voltar a vivê-la. E, numa boa, cansei de aprender, quero voltar a viver, logo.
Aí alguém pode dizer mil coisas legais. Tipo, que eu tenho a vida inteira pela frente. Ou que eu estava muito mal, agora estou muito bem... Ah um monte de coisas, que eu concordo. Mas isso a gente pensa depois. Quando eu voltar, vai ter feito no mínimo cinco meses que eu saí. E três anos que eu saí da roda. No mínimo da forma como todo mundo costuma a rodar, né. E, pensando agora, estou bem animado pra voltar. Mas, sei lá, acho que só quando firmar meus pés no chão mesmo é que vou sentir as diferenças em mim e no mundo. Porque eu não parei só de trabalhar. Isso, talvez, é o que faz mais diferença na rotina. O nosso dia a dia é definido por estudos e trabalhos, né. Isso é a maior referência, o que guia os horários, hábitos... muito do que se pode ou não fazer. Enfim, isso é um fato né, não precisa ser nem nerd, nem workholic. Todo mundo vive nessa estrutura. Ou quase todo mundo, vai... só pra não generalizar.  
Então, quando você não está trampando, nem nada, você fica meio avoado, meio solto no ar, é estranho. E eu ainda fiz alguns cursos, dei uma agitada quando meu ânimo permitia. Mas não é a mesma coisa. É aquele lance, o que você mais quer quando está na correria é ficar em casa, sem obrigação. E no meu caso, eu ainda continuei recebendo salário... perfeito, né, sem fazer nada e ganhando dinheiro! Mas meu, você pode odiar seu emprego (o que, penso eu, é mais comum que o contrário), mas experimenta ficar bundando em casa um período maior do que umas férias. Sério! Só não vale bater a cabeça contra a parede, com força, repetidas vezes! Heheh Não, eu não fiz isso... continuo são... eu acho! Mas, de verdade, é muito ruim, você fica bem perdido, perde um eixo que sempre organizou sua vida. Só essa mudança já é muita coisa pra cabeça.
O lance é que não foi só isso. Eu acabei saindo também da minha vida social. Foi gradativo, ficando cada vez pior. E chegou ao extremo de eu não sair de casa quase nunca nesse último ano. Quem quisesse me ver, tinha que ir em casa. A Jack, eu devo ter buscado na casa dela umas cinco vezes, no máximo, esse ano. Pra me ver, ela tinha que ir em casa. E ficar lá comigo. E pra ver ela, eu tinha que pedir pra ela ir em casa. Isso sem falar das temporadas internado. Com certeza isso não faz bem pra um namoro, viu! E com meus amigos também. Eu praticamente deixei de encontrar o pessoal. No primeiro ano até que consegui manter, só me incomodava com o fato de não poder beber com eles (estava reclamando de barriga cheia, né! rs). Mas depois, eu não me sentia confortável em sair com aquelas coisas todas, borseta, cateter e toda a situação. É, porque eu queria sair e curtir. Não queria estar mal e deixar todos preocupados comigo, se eu estava bem ou não. Mas não por querer dar uma de super-homem, não. Apenas porque eu queria ter aquele momento como todo mundo, ser mais um na roda de conversa, sei lá.
É difícil descrever essa sensação. Não gostava que ninguém percebesse meu esforço em estar ali. Por pior que eu estivesse, eu queria que pensassem que eu estava super bem. E como eu não sabia que teria o transplante, achava que viveria assim sempre. Então rolava um conflito, eu tinha que me acostumar com a situação. Não podia sofrer toda vez! Eu pensava que tinha que absorver essas dificuldades e seguir. E era isso mesmo que eu devia fazer, tinha que chegar ao ponto de achar tudo aquilo normal. Por isso eu me forçava a sair... a querer sair. Em casa eu ficava mais tranqüilo, era melhor receber as pessoas lá. Era mais fácil, mais seguro pra mim, por vários motivos. Mas ao mesmo tempo era ruim. Me incomodava ser visitado. Aquele lance de doente que não pode sair e os amigos vão visitar! E sempre achei que o esforço tinha que ser meu. Eu que tinha que ir atrás da vida e descobrir como viver desse jeito. Até porque não tinha pra quem perguntar nada, ninguém saberia me dar conselhos de como viver sem intestino! Por isso mesmo eu não podia esperar que ninguém soubesse lidar com essa minha nova condição e se adaptasse a mim. Eu que tinha os problemas, aquela realidade era minha, e eu que tinha que me virar e deixar as pessoas confortáveis com isso. Não podia passar essa responsabilidade pros outros, esperando que se virassem pra eu ficar bem, né. Senão seria sempre o amigo doente! Eu queria que todos fossem como sempre foram. Queria ser o Renato de sempre pra todo mundo. Claro, com as mudanças que vieram juntas, mas as mudanças na pessoa, na cabeça. Não queria ser diferente pelas restrições. Por isso não queria que tivessem que se pensar nessas coisas. Era o único jeito pra poder manter todas essas relações, que eram tão importantes pra mim.  
É confuso isso. Mas assim, mudanças seriam, e serão, inevitáveis em mim e na forma como me relaciono com o mundo. Eu não sou mais o mesmo de três anos atrás. Mas eu quero levar pra fora a parte boa disso tudo. Talvez isso seja orgulho. Pode ser, mesmo, sei lá. E se for, acho que é legítimo. Mas antes desse transplante, isso era praticamente impossível. Na maioria das vezes, estava sempre escrito na minha testa “estou mal”. Por exemplo, se eu ia em algum churras, ou coisa do tipo. Eu não queria que percebessem que eu estava morrendo de vontade de comer! Não tinha porque! Aquilo era um problema meu, eu que tinha que saber lidar com aquilo. E não sei nem se todo mundo sabia, poe exemplo, que eu não podia comer. Se me perguntavam se eu queria, eu falava que já tinha comido. O que não era mentira, né... eu já tinha tomado a nutrição mesmo! Era mais fácil assim, eu acho que era uma informação muito pesada. Imagina se me oferecem um lance pra comer e eu respondo “ah, que vontade, mas eu não posso comer porque não tenho intestino!” Meu, acabo com o dia da pessoa, na hora! Deixaria ela até se sentindo culpada por ter me oferecido! Pra quê? E eu sabia que teria comida, se eu não fosse dar conta de estar lá, eu que ficasse em casa e não enchesse o saco, ué! Mas o que eu queria é curtir, mostrar pra mim mesmo que era possível curtir, e que os meus problemas não eram maiores do que eu. Por mais que, muitas vezes eles, me quebrassem as pernas. Eu fazia isso pensando em o que faria o momento mais legal pra mim, mesmo. E se fosse legal pra mim, seria pra quem estava comig! Ah, eu queria uma energia tranqüila, sem aquele clima de preocupação, ou qualquer diferença em relação às outras pessoas. Queria só curtir um sábado de sol (aliás, "sábado de sol" sempre lembra aquela música do Mamonas Assassinas, né! heheh). E se eu não desse motivos pra se preocuparem comigo, então pronto, eu poderia estar mais relaxado, tentar ter um momento mais tranquilo, natural, por mais que minha situação estivesse longe de ser tranquila.
 Enfim, era complicado manter o pouco de vida social que eu tentava ter. Não era só sair e pronto. É aquilo que eu falei num outro post, tinha muita coisa entre eu e as pessoas. E isso me atrapalhou muito, me isolou, mesmo quando eu estava junto de todo mundo. E por mais que eu tentasse achar uma forma de conciliar tudo aquilo, era difícil. Era um esforço muito grande. Eu virei uma pessoa muito complicada. E tinha a parte prática também. Por exemplo, uma coisa que era chata quando eu saía era o banheiro. Eu precisava ter acesso sempre, a borseta enchia umas vinte vezes por dia, e tinha vontade própria. Então eu estava sempre usando o banheiro e às vezes tinha que ser rápido.
Rolaram algumas situações estranhas até, por causa de banheiro. Lembro uma vez que fui com a Jack, a irmã dela e o namorado, no Genésio. E, pra esvaziar a borseta, eu precisava usar a privada... apesar de ter ficado ninja em esvaziar em situações não muito favoráveis, como banheiro sem privada... inclusive um que era só um ralo no chão! Mas se se tinha privada, eu preferia, né! E dessa vez, eu estava esperando fora do banheiro, e veio um cara e eu deixei passar. E o cara perguntou porque e eu “Ué, preciso usar a privada!”. E depois, outra vez encontrei o cara, e ele “de novo?”. Aí eu já quase mandei a merda né... mija aí e não enche o saco! Aí o animal vira e “meu, você está indo cheirar pó no banheiro, né?” hahah! Era o que faltava ouvir! Não estou tomando nem cerveja e ouço uma dessas!Acho que o cara deve ter pensado “esse cara, magrelão, fica se trancando no banheiro toda hora e sai rapidinho...”. Eu fiquei sem reação, mas a Jack falou que eu devia ter levantado a camiseta e mostrado, só pra ver a cara de bunda do cara! Mas eu preferi não humilhar. heheh
Bom, mas eu disse isso tudo, pra explicar o porquê de eu estar tão ansioso pra voltar. Estou muito curioso, um pouco com medo também, pra ver como vai ser essa retomada. Como vai ser tudo depois de tanta água que passou debaixo dessa ponte. Com certeza não é só voltar a fita pra onde o filme tinha parado. Aonde vão estar as coisas que fizeram minha vida... onde estarão as novas partes dessa nova vida... e que partes são essas. Eu tento construir já esse recomeço, mas não tem como. Só dá jogar quando o jogo começa, antes você pode treinar o quanto for. Mas treino é treino, jogo é jogo! Heheh E com tantas mudanças nesse percurso, não consigo imaginar como vai ser quando começar a fazer as equações com todos esses fatores. Quero ver o que vai ficar, depois de tantas voltas em cada aspecto da minha vida. Só sei que vai ser diferente. E espero que pra melhor! Mas, ao mesmo tempo, estou com muita, mas muita vontade de voltar e viver tudo! Quero pagar pra ver! Aliás, literalmente né... já paguei, mesmo, agora só falta ver! Heheh
Ah, e, claro, quero voltar logo pra ir nos jogos da Libertadores, né! Já vou perder esse de quarta-feira. Ano passado só perdemos porque eu não pude ir! Mas esse ano não tem erro! Aliás, pensa comigo: no ano que eu comecei a me ferrar, 2008, o Corinthians foi pra segundona. Aí, 2009, começamos bem, ganhando tudo e ficando bem na foto... Mas no fim do ano perdemos o fôlego e 2010 desandou! Agora que eu recuperei, naturalmente, seremos campeões da Libertadores. Não sou eu quem está dizendo isso. É a lógica dos fatos! heheh Vai curintia!  

3 comentários:

  1. Ah! Agora ficou fácil de comentar... Tudo que pensei em lhe dizer, você se antecipou e disse que “não adiantará”... Rsrsrs
    Mas, é isso ae brother. A anciedade aumentar a medida que chegamos próximo do objetivo é “do animal”. Por exemplo: dor de barriga, quando chgamos perto do banheiro. Até o cavalo, após ter trabalhado um dia inteiro, quando percebe que está retornando ao curral, se anima e começa a correr. O lance agora é segurar as pontas, mas fala sério, você passou por coisas piores, isso agora é moleza!

    Acho que não me cansarei de repetir: “A cada post, adimiro ainda mais essa dulpa dinâmica”!

    Bjão e güenta as ponta!!!

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  2. Renas,

    Acho que o post de hoje é um dos melhores capítulos do seu livro. E quando for para os bestsellers, vai estar entre os primeiros da 'não ficção'. Mais verdadeiro e sentido, impossível.

    Aí, aponto pra página da 'VEJA' e digo, cheia de orgulho: 'Renato Consonni é meu sobrinho!!!, filho da minha Irmãzinha'. Vai, Renas! Vai, Sílvia! Essa ansiedade nas retas finais, acontece mesmo, como disse o Pê. Pensa que a gente aqui tbm não participa dos sentimentos de vocês, coadjuvantes que somos da história em que vc e a Santinha são os protagonistas?

    Bjs. Muitos beijos. Tia Rosa.

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  3. UM POST DIRETO NA VEIA.
    esse foi foda mesmo.

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