segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

EPOPÉIA 11

Ooooba!
                Tudo bem por aí? Aqui tudo certo. Amanhã tenho consulta e exames no hospital. Vamos ver se temos boas novidades. Eu acho que não vou ter engordado, não. Estou comendo pra caramba, de verdade. O lance é que a absorção ainda não está total. Então fica meio complicado. Vou ver se ele acha melhor eu aumentar a dose de remédio que ajuda na retenção dos líquidos. Não vejo outra coisa a ser feita. Porque eu não estou comendo coisas gordurosas demais e tal. Não estou tomando leite, que eu gosto pra caramba! Ou seja, estou comendo coisas leves, que deveriam ser melhor absorvidas. Acho que a única coisa a se fazer é aumentar a dose do remédio, mesmo. Vai ser assim até o meu intestino dar conta do serviço. E, se for ver, ele está trabalhando em período integral há pouco tempo, né! rs. Porque, depois que eu melhorei da rejeição e, principalmente, quando tirei o tubo e a borseta, é que comecei a comer normalmente. Então faz muito pouco tempo. E acho que estou no caminho.
Então é isso, amanhã vou lá pra definir de vez minha volta. É esse meu pensamento. Não tem mais o que fazer aqui, eu acho. Acabou o tratamento! E eu não falo isso querendo impor essa idéia. Nem a mim, nem a ninguém. Até porque não existe isso. Falo é com convicção, mesmo. Acredito nisso, de verdade. E meu aniversário está chegando, né! Já passei o Reveillon e o Natal aqui, passar o anversário de 30 anos, não... aí é sacanagem! E outra, eu sinto saudade de todo mundo, demais mesmo. Mas saudade da Jack é o que mais pega! Meu, você já passou seis meses longe da sua namorada? É meu amigo, é complicado... É como se estivesse sempre faltando alguma coisa... sei lá... é bem ruim, viu!
E agora, só pra terminar de vez o lance dos sonhos. Na verdade tem mais coisa na minha cabeça. Mas eu não consigo organizar essas memórias a ponto de torná-las compreensíveis. Eu tenho imagens na cabeça, uns flashes sem nexo nenhum com nada. Mas só pra concluir. Lembro do dia que um enfermeiro chegou pra mim e disse que tinha conseguido falar, por telefone, com minha família e eles estavam vindo me ver. Isso deve ter sido logo que eu acordei do coma. Mas na minha cabeça eu não tinha acordado só naquele dia. E eu pensei: “nossa, como eles souberam que eu estava aqui”. Achando que o enfermeiro tinha ido atrás da minha família, eu até agradeci o cara por ter avisado a eles! rs. E com certeza ele não disse isso, que falou por telefone! Foi viagem minha. E fiquei com o maior peso na consciência, pensando: “puts, eles tiveram que voltar da Austrália, por minha causa. Voltaram só porque eu me meti nesse rolo todo de ser atropelado. Vacilei, estraguei a viagem da galera!” E aí, não tenho muita noção de tempo, se foi no mesmo dia, veio me visitar a minha mãe, meu pai e o Dudu. Era só três por vez na UTI, né. Na verdade, o que estava rolando era a primeira visita deles depois que eu acordei do coma. E a primeira coisa que lembro é o Dú, pegando com força a minha mão e falando: “Tamo junto, Rê, tamo junto!”. E meio chorando. E eu não sabia porque ele estava chorando. Afinal, ele nem sabia o que tinha acontecido comigo! Ninguém sabia, já que eu não tinha contado pra ninguém minhas aventuras pelo Brasil! O meu pai falou, também choroso, que a Jack viria me visitar no próximo horário. E eu pensei: “Nossa, ela continua comigo, mesmo depois de eu ter sumido esse tempo todo!” heheh.
Aí eles foram embora. Eu ainda não conseguia falar. Pensei que era melhor recuperar a voz, pra então contar a todos o que tinha acontecido nesses dias em que eu havia sumido. Porque minha voz estava muito fraca, não saía direito. E no outro horário veio a Jack, o Daniel e minha mãe. E não sei o que me deu, mas essa hora eu queria ficar sozinho, não queria ninguém no quarto comigo. E primeiro minha mãe entrou no quarto, mas eu não tive coragem de falar pra ela ir embora. Pedi então pra chamar a Jack. E comecei a falar pra Jack, explicar que queria ficar sozinho e tal. Mas ela não entendia nada. Depois de um tempo, ela foi me contar que eu não estava só sem voz. Minha dicção estava toda zuada. Eu falava mole, tudo enrolado. Não era só um problema de não dar pra ouvir, ela ouvia, mas não dava pra entender. Achei muito doido isso, pois na minha cabeça eu soava normal, com a dicção perfeita. E ela, tadinha, ficou meio desesperada e saiu chorando do quarto, pois percebia que eu queria dizer algo, mas não entendia o que eu falava, e achou que eu ia ficar assim pra sempre, como se minha fala tivesse sido afetada por algum lance neurológico, sei lá. E ela foi e falou com minha mãe, que voltou ao quarto com meu irmão. Aí eu consegui fazer eles entenderem que eu queria ficar sozinho, e eles foram embora. Queria me lembrar o que me deu, porque, de qualquer forma, as visitas eram só de meia hora. E eu não achava que aquela era a primeira vez que eu via a Jack depois do coma, ela que me contou depois. O fato é que eu ainda estava muito doido!
E passaram-se uns dias e eu, sentindo minha voz melhor, resolvi contar o que tinha acontecido. Estavam no quarto o Du, o Daniel e minha mãe. O Du estava do meu lado esquerdo e eu virei pra ele e falei: “Mas vocês sabem porque eu estou aqui?”. Eles olharam um pro outro, com uma cara de “que que ele tá falando?”. E nessas entrou o enfermeiro Israel. Eu apontei pra ele e disse: “Esse é o cara! Ele me salvou!” heheh Coitado, o Israel não entendeu nada. E eu falei: “É, porque ele me pegou na calçada, eu estava jogado no chão e ele me levou pra dentro do hospital!”. O Daniel contou que, nessa hora, sem entender nada, achou que eu tinha, em um surto, tentado fugir do hospital e cheguei até a calçada me arrastando! Falou que quase foi quebrar o pau com o pessoal, que tinha deixado eu fazer isso! Heheh. E então eu comecei a contar tudo. Fiquei um tempão, contei o que tinha acontecido comigo. Meu, se alguém tivesse um gravador nessa hora ia ser animal, porque eu estava com tudo ainda fresco na cabeça, lembrava de tudo direitinho, cada detalhe, a ordem que as coisas aconteceram! Bom, aí eles viraram pra mim e falaram que tinha sido sonho. E eu: “que sonho, eu fui mesmo, o nome da cidade é tal, a boa velhinha chamava tal!”. E falei que, se me dessem um cavalo, eu poderia tocar quantos bois eles quisessem, pra provar que eu tinha aprendido! E como aprenderia estando, como eles diziam, naquela cama a tanto tempo? Não, era impossível ter sido sonho. Eu estava convicto. Aí o Dú perguntou quantos dias tinha durado essa minha viagem pelo Brasil. Eu disse: “cinco dias!”. E ele falou que tinha sido exatamente o tempo que eu fiquei entubado. Nessa hora eu passei a desconfiar que pudesse ter sido sonho.
Mas foi um lance muito complexo, confuso, isso tudo. Não é assim, foi um sonho e pronto. Até hoje, nas minhas lembranças, eu confundo um pouco, não tenho certeza se algumas situações realmente aconteceram ou não. E na verdade, não é certo dizer que o que rolou nesse sonho não aconteceu. Porque, assim, sou meio ignorante no assunto, mas a gente tem vários níveis de consciência. E naqueles cinco dias, eu não estava vivendo nessa realidade, aqui e agora. Mas eu estava vivendo, sim. As coisas aconteciam com uma lógica nesse outro nível de consciência em que eu estava. É que eu lembro agora só como flashs, sem o lance de tempo e espaço, o que faz as histórias ficarem sem muito nexo. Mas não foi assim que aconteceu. Era tudo muito natural. Tinha, sei lá, uma linha de tempo... eu dormia a noite, por exemplo. Senão, também, eu não levaria tanto tempo acreditando ter vivido, de fato, aquilo tudo! Sério, eles demoraram a me convencer que eu estive o tempo todo no hospital, entubado e babando. E a minha conclusão, hoje, é que eu vivi tudo aquilo, sim. É difícil entender, eu imagino, porque quando falamos em sonho e logo se imagina aquele que todo mundo tem a noite... Que uns lembram mais, outros menos, mas todo mundo tem. Só que foi diferente, foi muito mais profundo e intenso. Foi mais real. É isso, eu vivi aquilo tudo, em um outro nível de consciência, mas vivi.              
Ah, e outra coisa, essa história de luz, de ver uma luz e ir atrás. Comigo, não rolou! Muita gente me perguntou se eu vi essa tal dessa luz. Eu não vi luz nenhuma! E se for ver, é até bonito, né: “Oh, eu vi uma luz e fui atrás, não me rendi a morte, oh!”. Ah vá! Eu nem sabia que estava quase morrendo! Só soube quando me contaram, depois de acordado. Eu acho que não tem como, estando numa outra dimensão, você saber que está em outra dimensão! Bom, sei lá, não sou entendido do assunto, falo mais pela experiência que tive. Cada experiência é única, assim como cada pessoa é única, né. O que eu acho é que cada um que passa por isso, vive de uma forma, de acordo com a intensidade/gravidade da situação, as lembranças da sua vida, os símbolos culturais que acumulou... Enfim, só faltava agora ter um padrão, né: “Quando se está em coma, quase morrendo, você vai ver uma luz. Aí corre atrás dessa luz, senão você está fodido!” Heheh.
Bom, vou dormir. Um beijo pra todo mundo!

5 comentários:

  1. Cara que “viagem”. Pelo jeito puseram LSD no seu soro. Se os caras de Woodstock e seus “discípulos atuais” soubessem de suas viagens, fariam fila para ficarem internados na UTI.
    Sobre a Luz, mesmo que você não tenha passado essa experiência, valeu a dica. Eu pensei que a luz “era o lado de lá”, portanto, teria que fugir dela. Se você não explica, eu seguiria na contra mão! Bom, daqui uns 70 anos retomaremos esse assunto.

    Renas, o Ronalducho disse que irá aposentar. Você não acha estranho o cara tomar essa decisão dias antes do carnaval? Imagine o tanto que o cara não vai comer e beber... Como você mesmo diz, Barbárie!!!
    É isso ae, o tratamento acabou mesmo! “Bota pilha” no Dr. Rodrigo e vamos seguir o exemplo do camisa 9, vamos pra festa! (Quando digo seguir o exemplo, não estou generalizando, pois o cara “tem umas preferências duvidosas”...).
    Pe

    ResponderExcluir
  2. Obaaaaaaaa!!!!!!Tomara que o 'tio' te libere o mais rápido possível!!!...Será que vcs já vão tá aqui pro carnaval??Daí a gente faz uma farra daquelas!!!!!!!!

    Mas,falando dos sonhos,acho que alguém já disse isto aqui,mas eu vou repetir:

    "Ha mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia"!!!!!

    Porisso,tenho certeza que vc esteve,sim,nestes lugares todos...!!!!

    Fiquem com Deus,queridos!!!Bjs pra vcs!!!
    kamila

    ResponderExcluir
  3. Renas,

    Há coisas que vc fala que, por associação de idéias, são confirmadas pela lembrança de outros acontecimentos. Parece confuso, mas explico: a resiliência, que a Ana Rosa bem mencionou, me lembrou o Davi (segundo bisneto, 4 anos). Dias atrás, jogando bola com o tio e os primões(Caio, João Pedro, Daniel, Maria Rosa...), vendo-se em desvantagem, afirmou: 'tô sozinho,mas não vou desistir!'

    Agora, sobre vc falar, se sentir entendido e não pronunciar palavras inteligíveis... A Babi, (bisneta número 1, 5 anos), 'conversando' com a priminha Isabella(bisneta número 3, 8 meses), e tendo como resposta só balbucios, explicou: 'Vou te ensinar a falar, prima, mas só depois...agora seu coração ainda não tem som'

    Você tem o direito de duvidar, de me chamar de tia Míriam, tudo bem; mas isso eu ouvi e tbm me espantei. Achei incrível e torço para que o Davi continue desenvolvendo sua resiliência e que a Babi continue tendo explicações simples assim e verdadeiras.

    Fica bem, Renas Billy, fica com Deus e com a Santinha. Deus continue abençoando vocês...

    Tia Rosa

    ResponderExcluir
  4. Rê, não sei o porquê daquele 'anônimo' no meu post. E parece que vai sair de novo. Isso é trabalho para o SUPER-RODRIGO, porque a mim esse computador não obedece.
    Tia Rosa

    ResponderExcluir
  5. Oi Renê,

    Aqui é a Dani, loira, das Sociais.

    Fazia tempo que não lia seu blog, e foi uma delícia ler estes longos posts e ver que está tudo bem contigo! Muito bom ver fotos suas e ver que você está com a mesma cara de quando te conheci na Puc.

    Não consigo nem imaginar a ansiedade que você deve estar sentindo, tão próximo da volta. Epopéia é um nome mais do que apropiado pra descever esta sua jornada...

    Falando em epopéias, não consegui ler tudo o que você escreveu, mas não consegui evitar de pensar que este material todo que você produziu nos últimos meses daria um livro incrível. Já pensou no assunto?

    Um super beijo e uma ótima volta! Nos vemoa aqui na terrinha em breve!

    Dani

    ps: encontrei a Jack a um tempo, não sei se mencionei. Mande um beijão para ela tbem!

    ResponderExcluir